17.1.16
Guiné-Bissau continua a arder
Tendo passado nesta última década de um pequeno e mal amanhado estado da África Ocidental para um claro narco-estado, como afirmam estudiosos da categoria de Patrick Chabal (de que em breve sairá um livro sobre o assunto), a Guiné-Bissau continua a arder, ao mais pequeno rastilho.
O actual período de instabilidade política, mais um, entre tantos, começou em 12 de Agosto do ano passado, quando o Presidente José Mário Vaz, de 57 anos, natural de Cacheu, demitiu o primeiro-ministro Domingos Simões Pereira, líder do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).
Depois de um efémero Governo de iniciativa presidencial, liderado por Baciro Djá, e que o Supremo Tribunal considerou ilegal, o Presidente José Mário Vaz, um economista formado em Lisboa, aceitou dar posse a um novo executivo, liderado por uma das figuras mais antigas do PAIGC, Carlos Correia.
Nas últimas semanas, porém, o programa de Governo apresentado por Carlos Correia não conseguiu passar na Assembleia, uma vez que mais de uma dúzia de deputados do velho PAIGC quebrou a disciplina de voto e se absteve.
Perante tal facto, Abel Gomes, Adja Satú Camará Pinto, Adulai Bui, Amidu Keita, Bacai Sanhá Junior, Baciro Djá, Braima Camará, Eduardo Mamadu Baldé, Isabel Buscardini, Manuel Nascimento Lopes, Maria Aurora Sanhá, Rui Diã de Sousa, Soares Sambú, Tcherno Sanhá e Tomane Mane foram expulsos do partido e perderam o seu mandato parlamentar.
Agora, com novos deputados, em substituição dos que se recusaram acatar as directrizes de Domingos Simões Pereira e de Carlos Correia, o executivo espera poder finalmente passar na Assembleia Nacional, de modo a que se cumpram as esperanças de uma Guiné melhor.
Se acaso se mantivesse o impasse, se a equipa de Carlos Correia continuasse a não merecer a confiança de mais de metade dos deputados, o Presidente José Mário Vaz, um renegado do PAIGC, actualmente em conflito com a direcção de Domingos Simões Pereira, poderia ser tentado a promover uma vez mais um Governo de sua iniciativa, para o que contaria com o apoio do Partido da Renovação Social (PRS), o segundo do país.
Partindo da hipótese de que se formaria então um executivo à base dos dissidentes do PAIGC e dos quadros do PRS, ele nunca seria coisa para durar muito tempo, sempre com a hipótese em aberto de o chefe de Estado dissolver a Assembleia Nacional e convocar novas legislativas, com a grande sobrecarga que isso iria ter no erário público.
Entretanto, as casernas encontram-se em alerta, sempre com uma parte das Forças Armadas tentada a intervir, como já o fizeram uma série de vezes ao longo dos 42 anos de vida da Guiné-Bissau como um Estado independente.
Em 1963, quando começou a luta armada, os independentistas congregados no PAIGC tinham uma direcção coesa nas pessoas de Amílcar Cabral, Aristides Pereira e Luís Cabral, mas depois disso muita coisa aconteceu, muitas divergências foram surgindo, ao longo das décadas.
Agora, 53 anos decorridos sobre esses primeiros tempos de luta por um ideal comum, assiste-se a um conflito terrível entre diferentes facções do partido criado por aquele triunvirato, conflito esse que nem sequer é por motivos ideológicos, mas antes por um choque de personalidades e, até, por questões inerentes à partilha do bolo proveniente de negócios muito pouco lícitos.
O ideal para a Guiné-Bissau poderia ser, muito bem, passar uma série de anos sob curadoria internacional, enquanto se apurassem responsabilidades quanto a quem é que a conduziu ao estado actual, e se castigassem os culpados, sem qualquer hipótese de voltarem à ribalta.
Apenas uma nova geração de guineenses, com novos valores, é que talvez seja capaz de começar de novo; e de erguer enfim o país idealizado por Amílcar Cabral.
Se isso não for feito, corre-se o risco de uma permanente alternância entre breves períodos de esperança e largas temporadas de incerteza, com o povo a sofrer.
JH, para o África Monitor
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