Resignado, o povo aguentou oito estóicos dias que os proprietários da sua pátria, os homens da ZANU-Frente Patriótica, lhe dissessem qual é que tinha sido o resultado da primeira volta das presidenciais do fim de Março. Mas depois desses longos oito dias a clique dirigente ainda lhe veio dizer que era necessária uma recontagem dos votos, porque as contas não batiam certo. Ou seja, não estavam de acordo com aquilo que eles queriam. E o povo começou a ficar farto, muito farto, de tanta mentira, tanta poeira atirada aos olhos de quem tanto esperara, ao longo da década de 70, que ventos de mudança varressem a savana e levassem de vez o racismo rodesiano de Ian Smith.
Os shonas e os ndebeles na casa dos 30 anos lembram-se bem de que, na sua infância, os pais lhes contavam de como tudo era antigamente, um tempo de opressão; e começam a perguntar se acaso agora será muito diferente. Sim, é decerto diferente: os tiranos não têm a tez branca nem avós nascidos no Kent ou no Yorkshire; mas não deixam de ser tiranos, brutais, alheios aos sonhos dos seus compatriotas.
A opressão pode ser exercida por homens de qualquer cor; e no Zimbabwe, neste último quarto de século, ela tem sido exercida por esse Bokassa, por esse Idi Amin chamado Robert Gabriel Mugabe, que logo a meio da década de 1980 mandou matar 20.000 elementos da etnia ndebele, mostrando assim que não ficava nada a dever aos mais tenebrosos administradores que tivesse havido na época colonial.
A grande noite africana que hoje se vive na antiga Rodésia é a prova mais do que provada de que os antigos combatentes não só são capazes de derrotar um qualquer poder considerado opressor como de se transformarem, eles próprios, em carrascos quiçá piores do que os anteriores. E o facto de serem shonas e de terem assimilado o cristianismo às suas crenças tradicionais não os impede de surgirem aos olhos de pelo menos metade do seu povo como pessoas que urge afastar da cena política e social, para que não causem mais danos.
O Zimbabwe de Robert Gabriel Mugabe e dos seus generais é uma das nódoas mais negras que ao longo das últimas três décadas se constataram à face da Terra; e limpá-la vai ser tarefa para toda uma geração. Oxalá a limpeza possa começar quanto antes! Jorge Heitor
6 de Abril de 2008
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