30.12.06

Meles Zenawi é um grande jogador africano

Como num simples golpe de mágica, o chefe do Governo de Addis-Abeba, Meles Zenawi, aproveitou os últimos oito dias de 2006 para lançar no Corno de África uma “guerra-relâmpago” que reverteu por completo seis meses de impasse na vizinha Somália.
Aproveitando-se do facto de controlar um Exército de 150.000 a 180.000 homens, um dos mais poderosos de todo o continente, o pequeno herdeiro de um povo muito antigo, com largos séculos de independência, colocou fora de acção as milícias islâmicas que se haviam entrincheirado em Mogadíscio e noutras zonas do território somali.
Sob a sua condução, a partir de 1991, a Etiópia que teve um sistema feudal tornou-se um país com que o Ocidente, designadamente a Administração Bush, tem agora de contar para neutralizar o avanço islamista no Nordeste da África e o risco de um alastrar das actividades da Al-Qaeda, de Osama bin Laden.
Em 2006, Meles Zenawi foi um dos membros da comissão de Tony Blair para a África - encarregada de combater a extrema pobreza no continente - e ganhou mais notoriedade do que todos os seus adversários na região, fossem eles os dirigentes da Eritreia ou a União dos Tribunais Islâmicos (UTI) que se apoderara da capital somali.
Raramente, desde a Guerra dos Seis Dias, conduzida em 1967 pelo general israelita Moshe Dayan contra a Jordânia, o Egipto e a Síria, se viu assim um político agir de forma tão determinada para alcançar os seus objectivos, deixando o Conselho de Segurança das Nações Unidas praticamente sem saber o que fazer, perdido em contradições.
O Governo legítimo da Somália, reconhecido pela comunidade internacional, mostrou-se incapaz de, isoladamente, colocar o pé fora da cidade de Baidoa. Só o poderoso reforço etíope lhe permitiu, em escassos dias, dar uma reviravolta total na situação, como ainda em meados de Dezembro ninguém poderia imaginar que fosse possível.
Analistas tinham avisado que uma operação demorada poderia acarretar alguns dos perigos que as Forças Armadas norte-americanas têm vindo a enfrentar no Iraque. Por isso, Meles determinou que tudo se fizesse rapidamente e com força, a começar pelo bombardeamento dos aeroportos somalis, incluindo o de Mogadíscio.
Com os olhos do mundo porventura colocados noutras paragens, do Afeganistão ao Sudão, os Estados Unidos encorajaram discretamente o primeiro-ministro etíope e deram-lhe mão livre para avançar, de modo a derrotar sem apelo nem agravo aqueles que já estavam a ser vistos como os “taliban africanos”.
A médio prazo, o futuro poderá ainda reservar muitas surpresas tanto à Etiópia como à Somália, mas no imediato, num balanço de 2006 em África, Meles Zenawi é visto, indiscutivelmente, como um nome que se impôs.
Enquanto isto, os islamistas avisam que irão procurar compensar a sua “retirada estratégica” por meio de uma guerra não convencional, que poderá abranger atentados suicidas. Jorge Heitor/PÚBLICO 31 de Dezembro de 2006

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