30.8.12

A deslocação do Papa ao Líbano

O ministro que preside ao Alto Comissariado encarregado dos preparativos da visita do Papa Bento XVI ao Líbano, Nazem el-Khoury, confirmou que a deslocação se verifica de 14 a 16 de Setembro e que se trata de "um acontecimento importante não só para as comunidades cristãs, mas também para todas as comunidades do complexo país. Jorge Heitor Arménios, arménios ortodoxos, gregos católicos, gregos ortodoxos, maronitas, druzos, sunitas, xiitas e outros cidadãos libaneses terão este mês a oportunidade de verificar que a Igreja está viva e que se quer jovem, apesar de já ter completado dois milénios. "Uma certa confusão rodeou a viagem; mas os nossos encontros periódicos confirmam que a visita terá lugar e será um êxito", disse o ministro Nazem el-Khoury, segundo o qual o Líbano terá um importante papel a desempenhar, a nível regional, de modo a que o Papa se possa deslocar a um Médio Oriente sempre tão polémico. Por seu turno, o ministro da Informação, Walid Daouk, sublinhou que a arriscada deslocação é "histórica para o mundo árabe e para o Médio Oriente", nomeadamente nesta altura de tão grande agitação na vizinha Síria. E insistiu na necessidade de os diferentes órgãos de comunicação social cooperarem para que a visita não seja em vão. O que o antigo cardeal Josef Ratzinger vai fazer é aquilo a que se poderia chamar o itinerário de um homem honesto, de modo a demonstrar a necessidade de empenhamento dos católicos na construção do país em que vivem, sejam quais forem os tormentos por que tenham de passar ou até mesmo os desaires que se lhes deparem. O que os católicos querem é testemunhar que Jesus Cristo está vivo nos dias de hoje e deve ser escutado. O Oriente é um mundo mágico; mas existe a necessidade de uma verdadeira troca de experiências entre as Igrejas Oriental e Ocidental. Todos têm a aprender uns com os outros, num mundo de crescente globalização. A poesia das coisas Sírios, libaneses e palestinianos são sensíveis à poesia das coisas e nunca deixaram de estar abertos às realidades espirituais, tão necessárias à espécie humana. Serenidade e paixão têm de coexistir, para que se cumpra todo o universo da Bíblia, no qual Deus se cruza com os homens e as milhares, num Mistério tantas vezes difícil de entender. O sorriso e a doçura de Maria juntam-se aos contos das Mil e Uma Noites para que se tente compreender melhor a nobreza e as contradições do Mundo em que vivemos; e no qual tanto cabem as gentes da Europa como as do Crescente Fértil, da Índia, da China e de outras partes. É isso o que demonstram as viagens papais. Bento XVI não é só, não pode nem quer ser, apenas, um homem da Alemanha ou de Roma. Ele quer ir às raizes do Cristianismo; e aproximar-se por todas as formas e feitios de Jerusalém, da Terra Santa, não esquecendo nunca a Estrada de Damasco. Esta viagem do Papa vai levar uma forte mensagem ao Islão, recordando-lhe que tem de haver sempre lugar para a coexistência pacífica, nomeadamente na terra onde correm em paralelo os Montes do Líbano e o Vale de Bekaa. A terra pontuada pela existência de Tripoli, Beirute, Tiro e Baalbek. A terra onde sunitas e xiitas são tão cidadãos como os maronitas, os druzos e os gregos católicos. A proximidade geográfica entre uns e outros deve significar abertura e riqueza. Fiéis fragilizados Os fiéis minoritários e fragilizados pelas guerras que se têm verificado no Médio Oriente procuram na Exortação Apostólica que lhes é dirigida a partir do Vaticano novos horizontes e uma Nova Esperança para que reactualizem o seu testemunho e consigam consolidar a resistência bíblica à violência e às crises sociais. Os prelados e sacerdotes das Igrejas Orientais devem insistir na mensagem da Paz e da abertura ao Outro, pedindo em contrapartida que as comunidades cristãs sejam respeitadas pelo mundo muçulmano, tanto no Líbano, como na Síria, no Irão, no Iraque ou no Paquistão. Eles devem respeitar os seguidores de Maomé, para que possam construir igrejas na Arábia Saudita, no Qatar, no Egipto e em outras paragens. Padres e leigos esperam que a deslocação de Bento XVI signifique um apoio ao Líbano no contexto tão difícil que está a atravessar, quase que refém do descalabro sírio. Esperam uma confirmação do papel dos cristãos libaneses, quiçá hoje em dia já não tão fortes quanto o eram há 30 ou 40 anos; pelo menos em termos numéricos. A Exortação Apostólica para o Médio Oriente, a formalizar por Sua Santidade no dia 14 de Setembro, na basílica libanesa de São Paulo, está a ser aguardada tanto pelos maronitas e gregos católicos da plenície costeira como pelos druzos do interior; e até mesmo pelos sunitas do Norte e pelos xiitas que se repartem entre o Nordeste e o Sul do complexo mosaico a que os mais cépticos chamam "um país de doidos". O zelo missionário Afirmou já A Obra do Oriente que este é "o momento de renovar o zelo missionário nas igrejas do Médio Oriente, sobretudo para que se prepare o sínodo da nova evangelização e se descubram novos meios de propagar a fé em Jesus Cristo". E manifestou o desejo de que a viagem responda à procura que cada ser humano faz desejoso de viver na verdade do amor desse ser supremo a que chamamos Deus. A questão do impacto da deslocação do chefe da Igreja Católica depende muito do seguimento que a mesma tiver e da aplicação que for feita dos princípios então expressos, de modo a que o Líbano cumpra cabalmente o seu papel nesta bacia identitária que é o Mediterrâneo, onde cristãos, judeus e muçulmanos têm muito em comum, como a própria cozinha o testemunha, ao fazer tanto uso do azeite. O Mundo, seja ele a União Europeia, a Tunísia, a Líbia, o Egipto ou o Líbano, vive na esperança de dias melhores, numa luta quotidiana que nem sempre dá resultados rápidos, como tão bem o demonstrou a dita Primavera Árabe, que foi muito mais um desejo do que um facto concretizado. Os cristãos do Médio Oriente são tentados a emigrar, ao verificarem a consolidação do islamismo no mundo árabe, desde Rabat a Damasco; e isso só poderá ser contrariado se um novo papel lhes for atribuído numa sociedade onde haja múltiplos meios de comunicação e se respeitem tanto a dignidade humana como o pluralismo. Será que Bento XVI vai conseguir o milagre? O que toda a gente tem de compreender é que os cristãos do Médio Oriente não são de forma alguma um corpo estranho, mas antes fazem parte da população local. Ao fim e ao cabo, Cristo não era das Ilhas Britânicas nem dos Países Nórdicos, mas sim das bandas do Monte Líbano e do Monte Hermon, dos lados da Cesareia e da Galileia, das margens do rio Jordão... Já havia cristãos na Turquia, na Síria e no Líbano quando Maomé nasceu. De onde, a necessidade de uma mensagem forte ao Islão, para que não deturpe a História, antes se abrindo, para uma riqueza comum, sem grande choque de civilizações. Artigo que vai sair este fim-de-semana na revista comboniana Além-Mar

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