13.12.14

"Arco da Governação", que coisa estúpida!

Com a proximidade de eleições surgem sempre alguns políticos e comentadores a falar de um suposto “Arco da Governação”, da “Governabilidade”, ou do “Poder”, no qual se incluiriam apenas os partidos que têm tido responsabilidades de governo nos últimos tempos, como se a escolha de quem nos governa tivesse de ser condicionada e limitada. Tivemos, de facto, uma história de 48 anos em que a escolha esteve condicionada a um só partido e, mesmo depois de 1975, foi necessária uma intervenção serena e corajosa de Melo Antunes para recordar que todos os partidos, incluindo o comunista, eram importantes para a construção da democracia. Não pode haver portanto, numa sociedade democrática como a nossa, o tal “Arco da Governação” constituído pelos partidos que “podem” estar no governo, em que estariam o meu PS, o PSD, e o CDS, como também não pode haver um “Arco da Contestação”, nesse caso constituído pelos partidos permanentemente “excluídos” do governo, o PCP e o BE, apesar de terem representação parlamentar! Mas se não podemos admitir em democracia essa expressão do “Arco da Governação”, o que é então esse Arco de que tantos falam? Será um lugar como o do “Arco do Cego”? Será uma construção como o “Arco da Rua Augusta”? Será um “Arquinho” que, com um balão, vai aos Santos Populares? Ou será antes uma Arca? Uma “Arca de Noé” que tem de se procurar em terras distantes ou a “Arca Perdida” das aventuras de Spielberg? Que objecto será? Só a investigação histórica poderia desvendar esses mistérios! E não foi preciso ir muito longe nem recuar muito no tempo nesta investigação. A incontestável descoberta fez-se logo através da esclarecedora ilustração de Rafael Bordallo Pinheiro, aqui reproduzida. Ficava completamente claro e visível que o “Arco da Governação” de facto existia e era tradicionalmente usado pelos governos para lançar flechas dolorosas de impostos e outras penalizações de castigo a um Zé Povinho permanentemente acusado de “viver acima das suas possibilidades”. Claro que na investigação histórica também se descobrem outros Arcos que, usados por personagens simpáticos como Robin dos Bosques, devolviam aos pobres o que lhes era confiscado pelos ricos. Mas estes eram casos episódicos que, por serem excepção, ficavam na lenda e apenas confirmavam a regra do “Arco da Governação”. Nos dias tecnológicos de hoje este famoso “Arco da Governação” pode não ter existência física visível, mas continua a produzir os mesmos efeitos. E os governos, como o nosso, continuam a produzir com imaginação todo o tipo de flechas para cravar no Zé Povinho indefeso e incrédulo, inventando novos impostos e taxas, cortes nos salários da função pública, nas pensões de reformados, na educação e na saúde, insistindo na precarização do trabalho, com a constante promessa de que melhores dias estão quase a chegar… É que este governo obedece com tal convicção às ordens da Troika que esta até se pode afastar de forma “limpa” porque sabe que se continuará a disparar certeiro contra um Zé Povinho empobrecido e condenado pelos credores por ter acreditado e caído nas armadilhas dos seus próprios empréstimos. Afinal por querer de novo viver “acima das suas possibilidades”… Só se espera que, usando bem a arma do voto nas próximas legislativas, o Zé possa finalmente ser de novo senhor dos seus destinos, não aceitando a inevitabilidade de um imposto “Arco da Governação” que, afinal, não existe e nunca deveria ter existido. Francisco Castro Rego, Professor Universitário

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