O primeiro Presidente democraticamente eleito desde a proclamação da independência da Mauritânia, em 1960, Sidi Mohamed Ould Cheik Aballahi, de 70 anos, foi ontem derrubado, ao fim de pouco mais de um ano no lugar, pelos generais que horas antes afastara da chefia do Estado-Maior do Exército e de outros altos cargos. Um destes, Mohamed Ould Abdelaziz, que comandava a guarda presidencial e era já conhecido de anteriores manobras golpistas, aparece agora à frente de um Conselho de Estado. “Os agentes de segurança do Batalhão da Segurança Presidencial apareceram em nossa casa pelas 09h20 (hora local idêntica à de Lisboa) e levaram o meu pai”, contou à Reuters Amal Mint Cheik Abdallahi, filha do Presidente.
A União Africana, a União Europeia e os Estados Unidos condenaram o golpe e a Nigéria, que é o mais populoso país da África, declarou que não reconhecerá as novas autoridades, pelo que não se sabe ainda que hipóteses é que estas terão de sobrevivência.
Soldados instalados em jipes com metralhadoras pesadas montaram guarda aos edifícios governamentais; e a polícia chegou a usar gás lacrimogéneo para dispersar meia centena de pessoas que se manifestavam contra os os militares e diziam querer continuar “até à morte” com o Presidente afastado, que tomara posse em 19 de Abril de 2007.
Foi posto em causa o notável progresso democrático no país”, considerou a Comissão Europeia, que destinara 156 milhões de euros à cooperação com a Mauritânia no período de 2008 a 2013.
O país estava em crise há três meses, devido à subida do preço dos alimentos e às sequelas de uma série de ataques lançados no último ano pelo braço regional da Al-Qaeda, que inclusive levara a que fosse cancelado o rali Lisboa-Dacar.
Preocupação com portugueses
Ontem, na capital portuguesa, a secretaria de estado das Comunidades recomendou a qualquer cidadão que trabalhe ou que esteja de férias na Mauritânia (num total que não se estima superior a 12) que se dirija à embaixada da França em Nouakchot, se acaso necessitar de protecção, pois que Portugal não tem ali representação diplomática própria.
“Há umas duas semanas de que havia rumores de que poderia ocorrer um golpe de estado”, contou Ruairi Patterson, analista da Control Risks, que não crê que venham a ser muito afectados os investimentos nos sectores petrolífero e mineiro, designadamente por parte dos malaios da Petronas e dos franceses da Total. Precisamente três anos antes, a Mauritânia sofrera outro golpe militar, essencialmente dado, tal como agora, por elementos da guarda presidencial, que aproveitaram nessa altura a ausência do então Chefe de Estado, Maaouiya Ould Taya, que se deslocara à Arábia Saudita para ir ao funeral do rei Fahd.
O país faz como que uma ponte cultural entre o Magrebe e a África subsariana, sendo as suas águas ricas em peixe, que no passado chegou a ser muito procurado por pescadores portugueses. E em Leça da Palmeira, distrito do Porto, existe mesmo um restaurante chamado Viveiros da Mauritânia, evocativo do tempo em que aqueles pescadores andavam muito pela zona em frente ao Cabo Branco e à cidade de Nouadhibou.
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