12.2.14
Guiné-Bissau: Eleições possivelmente em Abril
O início do processo eleitoral na Guiné-Bissau estava marcado para o dia 16
de Março, mas no início de Fevereiro começou a admitir-se um novo adiamento,
desta vez para 13 de Abril.
Jorge Heitor
Perto de 800.000 eleitores guineenses vão ser chamados, em Março ou Abril, a
decidir quem é que deve ser o próximo Presidente da República e quem é que
serão os deputados, a partir dos quais se escolherá um novo Governo.
O Presidente de Transição, Manuel Serifo Nhamadjo, conferenciou com os
partidos, com o Governo interino e com instâncias internacionais, tendo-se
chegado à conclusão de que seria mesmo muito difícil concretizar o início da
ida às urnas no dia 16 de Março: e de que o mais aconselhável seria
transferir tudo para o domingo 13 de Abril.
Depois, no caso de uma segunda volta das presidenciais, ainda teriam de
decorrer mais algumas semanas, não se sabe ao certo quantas, até se conhecer
finalmente o chefe de Estado que os militares não permitiram que fosse
eleito em 2012.
O golpe de Abril
O golpe de 12 de Abril de 2012, liderado pelo Chefe do Estado-Maior General
das Forças Armadas, general António Indjai (foto), afastou para o exílio, em
Portugal, o Presidente Raimundo Pereira, que se encontrava em funções
interinas após a morte, num hospital francês, do Presidente Malam Bacai
Sanhá.
Exilado tem estado também o primeiro-ministro que nos primeiros meses de
2012 se candidatara à Presidência da República, Carlos Gomes Júnior (vulgo
Cadogo Júnior), então líder do Partido Africano da Independência da Guiné e
Cabo Verde (PAIGC) e pessoa que mais votos recebeu na primeira volta, antes
de o golpe militar ter impedido que houvesse uma segunda.
Nessa segunda volta, Cadogo Júnior iria enfrentar o antigo Presidente Kumba
Ialá, do Partido da Renovação Social (PRS), que congrega predominantemente
pessoas de etnia balanta, a mais numerosa do país, onde também há fulas,
manjacos, mandingas, papéis, beafadas, felupes e outros grupos.
Nem as Nações Unidas, nem a União Africana nem a Comunidade de Países de
Língua Portuguesa (CPLP) reconhecem o Presidente de Transição Manuel Serifo
Nhamadjo ou o Governo de Rui Barros, pelo que a Guiné-Bissau necessita
urgentemente de concretizar a nova ida às urnas, de forma a dotar-se de
autoridades que sejam verdadeiramente aceites por toda a comunidade
internacional.
A dupla Indjai-Ialá
Apenas a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), na
qual se destacam o Senegal, a Costa do Marfim, a Nigéria e o Burkina Faso,
têm tolerado o regime de transição, apadrinhado por António Indjai e por
Kumba Ialá, que desta vez não se apresenta ao eleitorado.
Quem volta a ser candidato é Cadogo Júnior, que entretanto perdeu a
liderança do PAIGC, num congresso que esteve agendado para Janeiro do ano
passado, 2013, e que acabou por só se efectuar durante a primeira quinzena
de Fevereiro de 2014, na cidade de Cacheu. Outros candidatos à Presidência
da República são nomes menos conhecidos: Paulo Gomes, independente, antigo
economista do Banco Mundial; Iaia Djaló, líder do partido Nova Democracia;
Afonso Té, Domingos Quadé e Nuno Nabiam.
Tudo na Guiné-Bissau tende sempre a ser adiado; e as próprias eleições a
realizar daqui a algumas semanas chegaram a estar prometidas para Abril
último, um ano depois do golpe dado pelos militares de Indjai, que terá de
ser forçosamente afastado da Chefia do Estado-Maior General das Forças
Armadas se o país desejar enveredar por uma via democrática, na qual os
militares se limitem a defender o território, sem querer permanentemente
interferir em tudo o que nele se passa.
Novo líder do PAIGC
O novo líder do PAIGC, eleito no dia 9 de Fevereiro último, é Domingos
Simões Pereira, de 50 anos, antigo secretário executivo da CPLP, condecorado
com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique e escolhido pelo Movimento
Internacional Lusófono (MIL) como Personalidade Lusófona do ano de 2013.
Este candidato a primeiro-ministro encontra-se inscrito no programa de
Doutoramento em Ciências Politicas e Relações Internacionais na Universidade
Católica Portuguesa, para o qual já concluiu a frequência académica e está
agora a formular a tese.
Segundo ele, tenciona ser parte das "soluções que se oferecem ao PAIGC",
pretendendo "assegurar uma transição geracional tranquila, de dignidade e
respeito para
uns e de oportunidade e realização para outros". O que se poderá traduzir
por vir a ocupar o lugar de primeiro-ministro, se acaso a formação política
criada por Amílcar Cabral vier a ganhar as próximas legislativas.
O objectivo da nova liderança do principal partido que existe na
Guiné-Bissau é convencer os parceiros do pequeno país a darem-lhe uma
oportunidade de se redimir, depois de tantas atribulações por que tem
passado nos seus 40 anos de existência.
A importância do petróleo e do gás
Agora, se se confirmarem as substanciais reservas de petróleo e de gás
natural que têm sido detectadas, bem como as de outras riquezas, inclusive
oiro, poderiam finalmente ser aproveitadas as potencialidades naturais,
fazendo com que entrasse mais dinheiro nos cofres do Estado e que este
pagasse a tempo e horas a todos os funcionários, beneficiando até as
condições de vida nos quartéis, pretexto dos militares para interferirem
constantemente na vida política.
As verbas a receber do petróleo, do oiro, do lítio e de outros recursos
poderão fazer, a médio prazo, com que altas figuras da sociedade guineense
deixem de sentir a necessidade de ser subornadas pelos narcotraficantes
latino-americanas, que têm vindo a utilizar o território guineense como
trampolim para chegar à Europa.
No entanto, também há quem receie que os proventos das novas riquezas que
têm vindo a ser assinaladas só sirvam para agravar a instabilidade política,
dada a inexistência de uma tradição democrática. Uma grande quantidade de
dinheiro a entrar na economia nacional poderia aumentar a rivalidade entre
os políticos e até mesmo perpetuar muitos dos males de que padece a primeira
das antigas colónias portuguesas na África a alcançar a independência, na
década de 1970.
Um jornalista ugandês que nos últimos 12 meses visitou por quatro vezes a
Guiné-Bissau, Mohamed Yahya, escreveu no The Independent, de Kampala, que
existe um abismo enorme entre o que actualmente se vive e aquilo que eram as
aspirações do PAIGC, quando disse que iria libertar aquela terra do
"despotismo colonial".
Comparação com a Somália
Como é que um movimento revolucionário que tão importante foi nos seus
primeiros tempos, com métodos devidamente elogiados na cena internacional,
quando Amílcar Cabral se impôs no panorama africano, veio a descambar em
algo comparável ao desmoronar da Somália? É isto o que se pergunta naquele
jornal do Uganda.
Um elemento do próprio movimento armado, Inocêncio Kani, abateu Amílcar no
dia 20 de Janeiro de 1973, na cidade de Conakry, capital da República da
Guiné, de língua oficial francesa, e a partir daí foram-se desvanecendo os
ideais humanistas que tinham presidido ao PAIGC, na altura da sua criação,
ainda nos anos 50. Esboroou-se o projecto de um desenvolvimento paralelo de
guineenses e cabo-verdianos, sucederam-se os golpes de estado, a partir de
1980, e chegou-se ao actual estado de coisas.
Cabo Verde é hoje em dia um oásis de paz, uma terra que tanto convive bem
com a Europa como com a África e com as Américas, enquanto a Guiné-Bissau se
apresenta como um dos mais infelizes países ao cimo da Terra, com elevados
índices de mortalidade infantil e de analfabetismo. Não se chegou ainda ao
ponto de 40 por cento da população, sequer, conseguir ler e escrever
normalmente em português, que é a língua oficial.
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Um país excepcionalmente jovem
A Guiné-Bissau tem uma superfície de 36.125 quilómetros quadrados, sendo o 138º país em tamanho, mas quando as marés sobem só 28.120 quilómetros quadrados é que ficam a descoberto.
Existem 386 quilómetros de fronteira com a República da Guiné e 338 quilómetros de fronteira com o Senegal, de modo que há que ter sempre em conta os interesses da África Ocidental francófona, na qual a Guiné-Bissau constitui como que uma cunha, sempre sujeita a apetites de vizinhos mais poderosos.
Com uma zona económica exclusiva de 200 milhas, que não tem meios para explorar, a Guiné-Bissau possui peixe, madeiras, fosfatos, bauxite, granito, lima e até mesmo petróleo, que a longo prazo poderão assegurar a sua sobrevivência.
A terra arável é de apenas 8,3 por cento e as culturas permanentes, nomeadamente de caju, não chegam sequer aos sete por cento, notando-se também uma grande desflorestação e erosão de solos.
A principal etnia é a balanta, com 30 por cento da população total, que é de 1.661.000 habitantes (o 152º país do mundo em termos populacionais). Depois surgem os fulas (20 por cento), os manjacos (14) e os mandingas (13).
Metade dos guineenses são muçulmanos, 40 por cento animistas e apenas 10 por cento cristãos; mas a Igreja Católica é muito respeitada e tem desde há muito uma catedral na principal avenida de Bissau.
País excepcionalmente jovem, a Guiné-Bissau tem 60,2 por cento dos seus habitantes com menos de 25 anos; gente que obviamente não tem memória da luta armada de que os militares tanto falam para justificar a sua constante interferência no quotidiano. E a idade média da população é de 19,7 anos.
Nem sequer metade dos guineenses vivem em centros urbanos, sendo a principal cidade Bissau, com cerca de 310.000 habitantes. Seguem-se Bafatá e Gabú.
A mortalidade à nascença é de 790 por cada 100.000 partos e a mortalidade infantil de 92,66, a quinta no mundo, a demonstrar que se trata de um dos países mais subdesenvolvidos.
A esperança de vida é de apenas 49,5 anos; uma das mais baixas de toda a Humanidade. E os hospitais apenas têm uma cama por cada mil habitantes; hospitais esses muito mal apetrechados, pouco aptos a tratar como deve de ser os casos de HIV, diarreia, hepatite e febre tifóide.
Apenas 55,3 por cento da população se encontra oficialmente alfabetizada; mas mesmo muitos dos que o são têm grande dificuldade em utilizar correctamente a língua oficial, que é o português.
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---- (Este trabalho vai sair em Fevereiro na revista missionária comboniana Além-Mar, por combinação feita com a respectiva direcção).
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