18.4.10

Libelo acusatório contra Zamora Induta

Vinte e três são as queixas contra o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas da Guiné-Bissau, almirante Zamora Induta, apresentadas ao Procurador-Geral da República, Amine Michel Saad, pelo vice-chefe do Estado-Maior, major general António Indjai.
Os sites Ditadura do Consenso e Clube K, este último angolano, deram na íntegra as 23violentas acusações do revoltoso Indjai contra o homem que ele diz que assumira demasiado poder e que não queria que o Presidente Malam Bacai Sanhá afastasse o primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior.
Como se sabe, toda a movimentação militar de 1 de Abril foi dirigida contra Induta e Carlos Gomes Júnior, que de há meses se encontravam num programa de pessoas a abater (ou netralizar) conhecido por todos aqueles que dia a dia procuram manter-se informados sobre a Guiné-Bissau.
Só alguém muito inocente ou distraído é que há cinco meses poderia pensar que o território guineense se encontrava estabilizado. Não estava, não está e não o virá a estar nos tempos mais próximos.
Falta de preparação cívica da maioria dos cidadãos, falta de preparação profissional das Forças Armadas, profundos conflitos étnicos, uma classe dirigente manchada pelo narcotráfico e profundas cobiças quanto ao petróleo, ao ouro, à bauxite e aos diamantes a haver...tudo isto se junta para tornar a Guiné-Bissau ingovernável.
Enquanto a maioria da população não falar correntemente a língua oficial do país, e enquanto as Forças Armadas não forem saneadas de algumas dezenas de oficiais corruptos, nada feito. Portugal perdeu a Guiné e esta depois perdeu-se a si própria.

17.4.10

A Guiné-Bissau é uma sucessão de ódios

(...) "e fiquei com interesse em saber das suas impressões sobre o país (ou o grupo) que apadrinha Carlos Gomes Júnior e J. Zamora Induta, que um dia talvez venham também eles a morrer de forma violenta, conforme já tem acontecido a tanta gente na Guiné-Bissau, desde 1973.
Sei que há quem vaticina que as mortes não se ficam por Helder Proença e Baciro Dabó, que o sangue poderá continuar a correr.
Muito cordialmente Jorge Heitor jheitor@mail.tmn.pt" isto dizia eu num e'mail que na tarde de 1 de Janeiro enviei para alguém pretensamente conhecedor dos meandros guineenses.

Portanto, ao começar o ano, eu já fora avisado de que se tramava algo de muito grave contra o primeiro-ministtro e contra o almirante Zamora Induta. E, assim, os acontecimentos de 1 de Abril último não constituíram qualquer surpresa.

Treze meses antes houvera "um conluio; um plano de decapitação do Estado", a acreditar no afirmado em 8 de Abril de 2009 à agência Lusa pelo então presidente do Tribunal de Contas, Francisco José Fadul.

"Zamora Induta há muito queria eliminar Nino Vieira, como já tinha conseguido eliminar Ansumane Mané" (líder da Junta Militar que derrotou Nino em 1999), declarou sem contemplações o antigo primeiro-ministro Fadul.

Até hoje, ainda ninguém explicou as circunstâncias em que morreram Nino Vieira e o Chefe do Estado-Maior General dessa altura, Tagma Na Waie. Foram mortos e pronto; tudo continuou na mesma. As mortes haveriam de prosseguir. Helder Proença, Baciro Dabó...

Há mais de 36 anos que é esta a vida dos guineenses, desde os tempos da chamada luta armada pela libertação nacional, que afinal não foi nenhuma libertação de ódios antigos. Antes pelo contrário.

O casino da ilha Caravela, nas Bijagós

Já ouviram falar do projecto de um casino e hotel para a ilha Caravela, uma reserva mundial da Biosfera, nas ilhas Bijagós, que fazem parte da Guiné-Bissau?
Sabem do interesse do multimilionário chinês Stanley Ho, desde há anos, pela Caravela, uma das 90 ilhas guineenses, ilhas não devidamente policiadas nem controladas por um Estado que na prática não existe?
Sabem do jogo, dos jogos, de Stanley Ho, que vêm lá do Extremo Oriente até à África e à Europa?
Há alguns anos que se fala deste projecto do grupo Geocapital para um lindo casino numas ilhas perdidas na costa ocidental africana, mas ainda ninguém assistiu ao arranque das obras.
Só o que se sabe é que entretanto já foram mortos Tagma Na Wae, Nino Vieira, Helder Proença e Baciro Dabó; e que o almirante Zamora Induta se encontra preso no quartel de Mansoa.
O jogo, os jogos, podem ser muito perigosos, numa terra onde até há almirantes; só o que não há é uma Armada para fiscalizar as ilhas ou um controlo aéreo para fiscalizar as diversas pistas de aterragem que têm proliferado, para facilitar a vida a colombianos, venezuelanos e outros que gostem de se passear por aquelas bandas.

Também começou a exploração de platina

Também vos posso anunciar agora que começou a exploração de platina no Nordeste da Guiné-Bissau, por intermédio da West Africa Mining Holding, cujas actividades envolvem pessoas da Alemanha, Suíça, Reino Unido e Portugal.
A platina, o ouro, o lítio, o irídio, a bauxite e os diamantes da Guiné-Bissau explicam muitas das movimentações destes últimos 14 meses, pois que as prospecções provocaram muitas cobiças; e ninguém quererá ficar sem o seu quinhão.
De há muito se referia que os Presidentes Nino Vieira e Lansana Conté, das duas Guinés vizinhas, eram sócios em muitas actividades, umas mais lícitas do que outras. E depois da morte de ambos os respectivos parentes, amigos e colaboradores trataram de levar por diante os seus negócios e as suas actividades exploratórias, devidamente combatidos por outros grupos.
Da Casamansa à República da Guiné há uma Cobra de cobiça a serpentear, passando por Pirada e pelas colinas do Boé. Talvez um dia venham a ser sobre tudo isto que se está a passar nas terras do antigo reino do Gabú.

14.4.10

Essa holding quer o ouro da Guiné-Bissau

No meio da grande crise político-militar que a Guiné-Bissau está a viver, a "holding" West Africa Mining, da Suíça, anunciou que que as suas prospecções de ouro no norte do país foram positivas.
A licença que o Governo de Carlos Gomes Júnior concedeu ao grupo, em Junho do ano passado, “cobre a exploração de todos os recursos minerais do país”, incluindo bauxite, lítio, irídio e diamantes.

Enquanto o ouro parece ser uma certeza no norte, a bauxite vai ser explorada na região do Boé, no Sueste, em cujas colinas a independência guineense foi unilateralmente proclamada em 24 de Setembro de 1973.

A investigação aurífera decorreu em 46 áreas com anomalias geofísicas. As análises da amostras “revelaram ser consistentemente positivas quanto à sua proporção de ouro”, afirma o comunicado ontem distribuído pela "holding" de Untermüli, no cantão de Zug, na Suíça de língua alemã.

Dados os resultados prometedores, a Westafrica Mineral Mining Ltd “decidiu apressar o processo”. Com base nas recomendações feitas por geólogos, a empresa “vai começar imediatamente um programa de extracção, de acordo com os padrões internacionais”.

A empresa M-Consult, do Mali, gerida pelo geólogo Ahmed El Madani Diallo, que foi candidato às presidenciais de 2002, está já contratada para concretizar a exploração aurífera no norte da Guiné-Bissau. Do trabalho até agora efectuado, conclui-se que o potencial de extracção de ouro é particularmente forte a leste de Canquelifa (já perto da fronteira com a República da Guiné) e entre essa localidade e Paunca (nas proximidades da fronteira com o Senegal).

As reservas senegalesas de ouro estão avaliadas em 60 toneladas, incluindo 30 toneladas de ouro aproveitável com fins industriais. E na República da Guiné (Conacri) a bauxite é a principal produção mineira, pelo que desde há décadas se admite que também a Guiné-Bissau virá um dia a explorar esse produto.

Figo na direcção de uma grande holding mineira

As already previously announced, at the upcoming general meeting of West
Africa Mining Holding AG, the former Portuguese international football star
Luis Figo will be recommended for election to the board of directors. As a member of the board of directors, Luis Figo will not only provide the company with valuable contacts, but he
will also take an 11% share in the company through his private investment
holding company, Damafh S.G.P.S. Lda., in Lisbon.

Alongside Luis Figo, well-known expert in capital markets Swen Lorenz is
also standing for election to the board of directors of West Africa Mining
Holding AG.

Mr Lorenz is a renowned expert in locating investment opportunities in
newly industrialised countries and pioneer markets. He was instrumental in
the founding and creation of Speymill Macau Property Company, a property
company listed in London which has been able to increase its equity to
around $150m in two rounds of financing and therefore became one of the
first large foreign investors into Macau’s property market. Mr Lorenz was a
member of the board of this company between November 2006 and July 2009.
Through his work as a private investor, writer, columnist and regular
television guest, he is able to provide an extensive and close-nit network
for the company. Amongst other things, he will help the company by opening
up sources of finance on the international capital market.

‘In West Africa, there are still under-developed markets in the traditional
sense. Any type of operative business creation in this area represents an
enormous challenge. However, this type of pioneer market offers the chance,
if successful, to achieve extraordinarily high returns,’ says Lorenz. ‘West
Africa Mining Holding AG finds itself at an early stage of development into
which I would like to bring my experience from other similar projects and
support the company management in strategic measures and capital market
issues’.

Subject to the vote of the general meeting, the newly-formed board of
directors will consist of Mr Swen Lorenz (chairman of the board of
directors), Luis Figo (board of directors) and Peter Sommer (board of
directors).

The general meeting is scheduled for the end of April.

13.4.10

Barbaridades nos meios militares guineenses

Zamora Induta e Samba Djaló

Oficiais guineenses detidos em Mansoa em “condições infra-humanas”

Por Jorge Heitor


A Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH) disse hoje ao PÚBLICO que a sua maior batalha é a “libertação incondicional” do chefe do Estado-Maior das Forças Armadas e do chefe da contra-inteligência militar, “que se encontram em condições infra-humanas”.
Este último, coronel Samba Djaló, preso numa casa de banho do “estabelecimento prisional” de Mansoa, a 60 quilómetros de Bissau, “sofreu coronhadas na cabeça” e apresenta igualmente ferimentos nas pernas.

Djaló e o chefe do Estado-Maior, almirante Zamora Induta, foram conduzidos para o aquartelamento daquela localidade dois dias depois de detidos, a 1 de Abril, pelas tropas que se rebelaram. Lá continuam, sem que para isso tivesse havido qualquer decisão judicial. Apenas o querer dos amotinados, liderados pelo vice-chefe do Estado-Maior, major-general António Indjai.

Induta “quando vai à casa-de-banho só deita sangue”. Foi visitado por um médico que lhe prometeu medicamentos, mas eles nunca apareceram, disse a LGDH, segundo a qual o almirante, que foi nomeado no ano passado para substituir na chefia do Estado-Maior o assassinado general Tagma Na Waie não está autorizado a receber a visita da família.

Ainda segundo um relatório daquela instituição humanitária, que com ele só conseguiu falar na presença dos militares seus carcereiros, Zamora Induta por pouco não foi morto no trajecto entre a base aérea de Bissalanca, onde primeiro esteve detido, e o quartel de Mansoa, considerado um reduto do sublevado Indjai. Alguns dos militares que o escoltavam teriam dado indícios de ser esse o seu desejo.

Quando chegou já de noite ao aquartelamento agora a funcionar como “estabelecimento prisional”, o almirante Induta passou algumas horas sem ter sequer um cobertor ou um colchão, coisas que só mais tarde lhe foram facultadas.

Até hoje, nem o Presidente Malam Bacai Sanhá nem o Governo de Carlos Gomes Júnior conseguiram fazer fosse o que fosse para libertar os dois oficiais detidos há 12 dias, numa acção em que Indjai contou com a colaboração do contra-almirante Bubo Na Tchuto, que foi buscar à representação das Nações Unidas na Guiné-Bissau, onde se encontrava refugiado.

Entretanto, Bubo Na Tchuto foi indiciado pela Administração norte-americana como uma das personalidades guineenses profundamente ligadas ao narcotráfico que passa pela África Ocidental e que parece condicionar toda a evolução do país durante os últimos anos.

Angola está ainda longe de vencer a corrupção

O Governo de Angola ainda não fez o suficiente para combater a corrupção e a má gestão generalizadas, disse hoje a organização não governamental Human Rights Watch (HRW), num relatório de 31 páginas distribuído em Washington.







Apesar de o Produto Interno Bruto (PIB) do país ter aumentado mais de 400 por cento nos últimos seis anos, os angolanos não estão a assistir a uma melhoria de vida proporcional a este aumento, afirmou a HRW no seu trabalho “Transparency and Accountability in Angola: Un Update”.



No entender do relator, o Governo de José Eduardo dos Santos apenas tomou algumas medidas para aumentar a transparência depois de em 2004 a organização ter dito que milhares de milhões de dólares provenientes da exploração do petróleo estavam a passar ilegalmente à margem do Banco Nacional de Angola (BNA) e a desaparecer sem qualquer explicação.



“É necessário que o Governo adopte medidas rigorosas de combate à corrupção e ao secretismo que põem em risco os direitos dos angolanos,” declarou Arvind Ganesan, director do Programa de Negócios e Direitos Humanos da HRW. “A nação é rica em recursos, mas o povo vive na pobreza.”



Segundo este estudo, um acordo celebrado recentemente com o Fundo Monetário Internacional (FMI), depois de se ter desenvolvido a crise financeira global e verificado a queda do preço do petróleo, oferece alguma esperança de que haja melhorias, caso as suas cláusulas sejam cumpridas.







Indicadores humanos desastrosos



As autoridades angolanas já melhoraram a publicação de dados relativos às receitas de petróleo, mas os indicadores humanos do país continuam a ser desastrosos e não têm correspondeido de forma alguma ao rápido crescimento da riqueza nacional. Angola é agora o maior produtor de petróleo da África Subsariana, tendo ultrapassado a Nigéria; mas o acesso de milhões de angolanos aos serviços básicos de assistência social é ainda muito limitado.



O maior dos territórios africanos de língua oficial portuguesa ocupa a posição 143 entre um conjunto de 182 países referidos no Índice de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).



Quanto à classificação de Angola no Índice de Percepção da Corrupção elaborado em 2009 pela Transparency International foi ainda pior do que no ano anterior, tendo descido do lugar 158 para o 162, num conjunto de 180 países sobre os quais foram apresentados dados.



O relatório hoje conhecido vai mesmo ao ponto de expor novos indícios de corrupção e má gestão, citando o caso de Aguinaldo Jaime, antigo ministro das Finanças que de 1999 a 2002 ocupou o cargo de governador do BNA. Tal como foi documentado num relatório elaborado em Fevereiro último pelo Senado norte-americano, Aguinaldo Jaime - que chegou a ser ministro adjunto do então primeiro-ministro Fernando da Piedade Dias dos Santos, agora vice-presidente da República - deu início a uma série de transacções suspeitas com bancos norte-americanos, no valor de 50 milhões de dólares (36,7 milhões de euros).



Durante os três anos em que Aguinaldo Jaime esteve à frente do BNA, o Governo angolano não conseguiu explicar que destino teriam tido 2.400 milhões de dólares (1.766 milhões de euros), sublinha o documento hoje divulgado.



Nos últimos meses, o Presidente José Eduardo dos Santos anunciou uma “estratégia de moralização da prestação de serviço na Administração Pública”, com aprovação de uma Lei sobre a Probidade Administrativa e reorganização das Finanças Públicas.



“Probidade, no senso comum, quer dizer honestidade, honradez, integridade de carácter”, explicou em Fevereiro o chefe de Estado, que prometeu “começar de novo, com novos métodos de trabalho, outra disciplina, nova consciência e um perfil do servidor público mais adequado às tarefas e à função que lhe confiam”.



José Eduardo dos Santos reafirmou então a sua alegada “tolerância zero em relação à repetição e vícios do passado na Administração Pública”.

11.4.10

Cabinda, que mais se poderá dizer?

Comunicaram-me esta noite mais 10 detenções em Cabinda, por as pessoas andarem com camisolas com as fotos de Raul Tati e de outros detidos no processo aberto na sequência do atentado contra a selecção togolesa de futebol.
Parece um assunto difícil de resolver, este de Cabinda, até porque a maioria da comunidade internacional não se importa absolutamente nada com o que ali se está a passar.
Cabinda é uma palavra mágica no imaginário português, mas os portugueses de hoje em dia vão tendo cada vez menos imaginação; mormente no que diz respeito ao seu passado histórico.
Muitos portugueses parecem ter vergonha de algum dia ter a Pátria andado pela foz do rio Zaire, ou Congo, e estabelecido tratados com as autoridades tradicionais da região.
Muita gente, hoje, em Lisboa, não quer saber absolutamente nada das sequelas daquilo que representantes da Nação negociaram em 1884 e 1885, com sobas africanos.
Rasgou-se o Passado; perdeu-se a Memória.

8.4.10

EUA punem Bubo Na Tchuto

“Acha a reforma das forças de defesa e segurança uma prioridade?”. Foi esta a pergunta que o site oficial das Forças Armadas da Guiné-Bissau colocou em linha no dia 18 de Novembro do ano passado. E até ontem 282 pessoas (78,1 por cento) tinham votado sim e 79 (21,9 por cento) dito não. Ao inaugurar o site, o Chefe do Estado-Maior General, almirante José Zamora Induta, transmitira a “determinação de fazer destas Forças Armadas um símbolo da unidade nacional e um espaço que congregue e una as diferentes sensibilidades e personalidades do povo guineense num único sentido e objectivo comum”.
Agora, alguns meses depois, Induta encontra-se detido e teme-se que volte a correr sangue nas ruas de Bissau, porque os militares não estão unidos e o seu vice-chefe, major-general António Indjai, é cada vez mais uma referência dos balantas, o principal grupo étnico do país, congregando 30 por cento da população. Apesar de a prática multipartidária ter sido introduzida na Guiné-Bissau em 1994, as tropas têm continuado a ser um centro de instabilidade política, através de levantamentos como os de Ansumane Mané (1998), Veríssimo Correia Seabra (2003) e, agora, Indjai.

Editorial do PÚBLICO sobre a Guiné-Bissau

A farsa da estabilidade em Bissau

A única estabilidade que há em Bissau é a das armas e o que for dito em contrário não passa de perigosa ilusão.
Ontem, o ministro português dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, veio finalmente dizer sobre a Guiné-Bissau o que se impunha: que o poder político "permanece refém de uma estrutura militar" e que é preciso que esse mesmo poder político tome uma opção clara e rápida: "Ou entra numa via de estabilização e de construção de um Estado democrático ou se isola e se torna num caso flagrante de um Estado falhado." Isto porque nos últimos dias tem sido posta a circular, erroneamente, a ideia de que haveria em Bissau estabilidade. Ora a única estabilidade que há em Bissau é a das armas e o golpe de dia 1, travestido em "incidente", é disso prova cabal. Presidente e primeiro-ministro continuam reféns do poder das espingardas e mesmo a democracia já há muito se transformou numa farsa, quando as instituições se vêem privadas do poder que lhes cabe face ao poder fáctico do chefe fardado mais em voga.
Por isso, de nada adianta o primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior (o tal que foi preso por militares há dias, chegando mesmo a ser por eles ameaçado de morte) vir dizer que a "situação está ultrapassada" ou que se deve trabalhar "para apaziguar os ânimos". Porque ele, neste estado de coisas, não pode garantir nada. Nem o Presidente, Malam Bacai Sanhá, que ontem foi a Luanda tentar nova desdramatização. A Guiné-Bissau só terá solução quando o poder militar for submetido hierarquicamente ao poder civil e isso só sucederá quando o exército deixar de ter "vida própria", como até aqui. Se as armas e os interesses do narcotráfico continuarem a ditar as leis, não haverá Estado de direito (que ali nunca houve, mas se deseja) nem socorro internacional que lhe valha.

7.4.10

É o petróleo que faz mover muita coisa

O Presidente da Guiné-Bissau, Malam Bacai Sanhá, foi hoje a Luanda. O regime de José Eduardo dos Santos mandou-o buscar num avião da Sonair, a empresa de aviação do grande consórcio petrolífero Sonangol.
Angolanos, sauditas, norte-americanos, holandeses, noruegueses, escoceses e outros estão interessados nas prospecções de petróleo nas águas das ilhas Bijagós e de Bolama.

Guiné-Bissau é refém dos seus militares

O poder político guineense “permanece refém de uma estrutura militar”, declarou à agência Lusa o ministro português dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, que tem estado diariamente em contacto com os principais órgãos de soberania do país.
“A Guiné-Bissau tem de fazer definitivamente esta opção: ou entra numa via de estabilização e de construção de um estado democrático ou se isola e se torna num caso flagrante de um estado falhado”, disse Amado, numa altura em que o Conselho de Segurança das Nações Unidas se encontrava em consultas sobre a necessidade de repensar toda a estratégia da segurança naquele país. E em que o Presidente Malam Bacai Sanhá encetava ontem conversações em Angola, um dos seus principais apoios.
“Não queremos aceitar o normal que não é normal” afirmou entretanto o chefe da diplomacia de Cabo Verde, José Brito, também ele convicto de que a conjuntura guineense actual “é muito complexa e pode lançar a Guiné-Bissau numa situação irreparável”, como considerou Amado.
Dia 1 de Abril militares dirigidos pelo vice-chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, general António Indjai, foram à procura do Presidente da Assembleia Nacional Popular, Raimundo Pereira, que não se encontrava na capital (nem aparentemente no país), sequestraram durante algumas horas o primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior e detiveram o Chefe do Estado-Maior, almirante Zamora Induta, bem como o chefe da secreta militar, coronel Samba Djaló.
Indjai actuou em coordenação com um antigo Chefe do Estado-Maior da Armada, contra-almirante José Américo Bubo Na Tchuto, que foi buscar à representação local da ONU, onde se encontrava refugiado desde que regressara do exílio na Gâmbia, no fim do ano passado; e que é tido como pessoa afecta ao narcotráfico sul-americano que passa pela África Ocidental.
Malam Bacai Sanhá tem estado sob pressão de uma facção dos militares e de partidos da oposição para afastar Carlos Gomes Júnior, mas também teve de tomar em conta os conselhos da comunidade internacional no sentido de não demitir um primeiro-ministro que é o resultado das legislativas de 2008.


Bubo Na Tchuto e António Indjai chegaram na semana passada a alegar que o chefe do Governo, e líder do PAIGC, seria conivente com alegados planos de Induta para promover execuções ou afastamentos compulsivos nas Forças Armadas, como já muitas vezes se têm verificado, desde que em 1974 Portugal reconheceu a independência da Guiné-Bissau.

Depois das primeiras horas da presente crise, Indjai foi forçado pelo Presidente da República a moderar-se e a pedir desculpas por ter, inclusive, ameaçado publicamente matar Carlos Gomes Júnior, se os partidários dele não deixassem de se manifestar nas ruas, a seu favor.



Primeiro-ministro em cheque

Quem pretende o afastamento do primeiro-ministro são, segundo o boletim confidencial “África Monitor Intelligence”, de Lisboa, o Partido da Renovação Social (PRS), de Kumba Yalá, o Partido Republicano para a Independência e Desenvolvimento (PRID), de Aristides Gomes (que era um dos homens de confiança do antigo Presidente Nino Vieira); e ainda uma ala do próprio PAIGC.

Tem-se falado da hipótese de os contestatários procurarem apresentar na Assembleia uma moção de censura, susceptível de ser aprovada se aos deputados do PRS e do PRID se juntassem pelo menos 20 dos 70 deputados do PAIGC, numa câmara legislativa de 100 lugares.

O actual Governo, constituído no fim de 2008, tem vindo a procurar reunir no exterior os meios financeiros necessários para a reforma das Forças Armadas que toda a gente considera essencial, dada a anomalia de as mesmas contarem com mais oficiais e sargentos do que propriamente com soldados.

O Japão, que se encontra este mês a presidir aos trabalhos do Conselho de Segurança, anunciou para Junho, em Nova Iorque, uma mesa redonda de dadores destinada a juntar o dinheiro para as reformas, de modo a que os militares guineenses não continuem a ser uma fonte permanente de desestabilização.

1.4.10

O gigante nigeriano

As centenas de vítimas cristãs da tragédia de Março no Estado do Plateau, um dos 36 da Federação Nigeriana, criada há meio século em territórios que haviam sido colonizados pela Grã-Bretanha, vieram reacender a batalha pela verdadeira alma de um país que se encontra perdido nas suas múltiplas contradições.



Jorge Heitor, na revista Além Mar de Abril 2010



Quando os pastores muçulmanos fulas e hauçás desceram sobre as aldeias cristãs dos arredores da cidade de Jos, vingando recontros que as duas partes haviam tido em Janeiro, reacenderam os problemas de um espaço enorme que tem sido um dos mais problemáticos da África, nos seus 50 anos de existência como entidade independente.

A violência étnica e religiosa no centro da enorme Nigéria, perto da capital federal, Abuja, é apenas o mais recente dos múltiplos problemas do país, que já há quatro meses não conseguia ver o seu presidente, Umaru Yar’Adua, por este se encontrar gravemente doente.

A primeira-dama e os conselheiros mais chegados do chefe de Estado nunca aceitaram que ele fosse dado como incapaz e cessasse funções, antes mantendo a ténue esperança de que dentro de mais algumas semanas ele se reabilitasse e voltasse ao lugar para que foi eleito em 2007.

Uma vez que o vice-presidente, Goodluck Jonathan, é cristão, apenas o colocaram a assumir o interinato, mas sem os verdadeiros poderes de um presidente a tempo inteiro, que estes costumam as elites muçulmanas do Norte do território reservar para os seus.



Mulheres e crianças



Foi essencialmente sobre as mulheres e as crianças que se abateu a fúria dos pastores nómadas que desceram das colinas e procuraram novos pastos, nas terras lavradas por pobres camponeses cristãos.

Um dos países mais corruptos do mundo e um dos grandes produtores de petróleo africanos, a Nigéria está agora perante o fantasma de, uma vez mais, como algumas vezes no passado, cair sob a alçada das suas Forças Armadas, sempre prontas a assumir o comando quando os políticos não se entendem ou não sabem estar à altura das circunstâncias.

Violência étnica no Centro, agitação no Sueste, entre as populações do delta do Níger, vítimas da exploração petrolífera, embate entre facções políticas, aproximação de um período eleitoral, previsto para daqui a um ano, tudo isto se conjuga para fazer da Nigéria um autêntico barril de pólvora.

As eleições de 2007 foram manchadas por uma gigantesca fraude, que deu ao Partido Democrático Popular (PDP) 60 por cento dos deputados federais e 75 por cento dos governos dos Estados. E na Presidência ficou um homem que se revelaria muito doente, dos rins e do coração, talvez para que na sombra o seu antecessor, Olusegun Obasanjo, continuasse a exercer um certo poder.

Os militares têm procedido a execuções sumárias, grupos de milícias procedem a raptos, há tortura, violação e outros tratamentos desumanos de detidos, conforme no dia 11 de Março denunciou o Departamento de Estado norte-americano.

Pessoas são detidas arbitrariamente e ficam tempos infindos a aguardar julgamento, restringe-se a liberdade de expressão, as mulheres são discriminadas.



Grande nau, grande tormenta



Costuma-se dizer que quando há uma grande nau também há uma grande tormenta; e é este precisamente o caso no mais populoso dos países africanos, aquele que até já assistiu, durante alguns anos, ao separatismo de uma parte do seu solo, que se proclamou unilateralmente República de Biafra. Foi um dos períodos mais dolorosos da história africana do fim da década de 1960; e aqueles que o testemunharam jamais o poderão esquecer.

A agitação destes últimos anos, no delta do rio Níger, é precisamente o fantasma de que outro Biafra poderá vir a acontecer, se acaso os políticos nigerianos não se conseguirem entender e organizar quanto antes, de forma ordeira, as suas próximas eleições gerais; eleições que alguns até gostariam de ver antecipadas.

Milhares de pessoas encontram-se deslocadas no delta do Níger, perto da fronteira com os Camarões. E em alguns Estados setentrionais verificou-se no ano passado a revolta do grupo extremista islâmico Boko Haram, segundo o qual «a educação ocidental é um pecado».

Seja qual for o ângulo pelo qual encaremos a Nigéria, o do confronto Islão-Cristianismo, o das tensões étnicas, o das redes terroristas que procuram instalar, o panorama não é de modo algum animador.

Por isso, é de louvar que ainda haja revistas capazes de se preocuparem com isto, quando tantas rádios e televisões só têm olhos para o Iraque, o Irão, a Coreia do Norte e meia dúzia de outras regiões do mundo, esquecendo de um modo geral o que se passa a sul do Sara.

De Sokoto e Kano a Port Harcourt há um mundo imenso a descobrir e a noticiar, mundo que porventura só o bom espírito missionário esteja interessado em trazer ao conhecimento do maior número possível de cidadãos.



50 Anos



A Nigéria é um daqueles muitos países africanos que se tornaram independentes entre 1957 e 1962, mas que infelizmente ainda não conseguiram atingir a maturidade que seria própria de quem já chegou aos 50 anos. Há que notar, porém, que os países demoram muito mais tempo a amadurecer do que os homens. E que Portugal necessitou de uns bons três séculos para se solidificar desde o Minho ao Algarve, começando a estender as suas ramificações aos Açores e à Madeira.

Roma e Pavia não se fizeram num dia, diz o velho ditado popular. E oxalá que isto nos possa servir um pouco de consolo quando reflectimos sobre as tremendas dificuldades por que a Nigéria está a passar. Se Deus quiser, talvez os nossos piores receios nunca se cheguem a concretizar.