8.4.10

Editorial do PÚBLICO sobre a Guiné-Bissau

A farsa da estabilidade em Bissau

A única estabilidade que há em Bissau é a das armas e o que for dito em contrário não passa de perigosa ilusão.
Ontem, o ministro português dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, veio finalmente dizer sobre a Guiné-Bissau o que se impunha: que o poder político "permanece refém de uma estrutura militar" e que é preciso que esse mesmo poder político tome uma opção clara e rápida: "Ou entra numa via de estabilização e de construção de um Estado democrático ou se isola e se torna num caso flagrante de um Estado falhado." Isto porque nos últimos dias tem sido posta a circular, erroneamente, a ideia de que haveria em Bissau estabilidade. Ora a única estabilidade que há em Bissau é a das armas e o golpe de dia 1, travestido em "incidente", é disso prova cabal. Presidente e primeiro-ministro continuam reféns do poder das espingardas e mesmo a democracia já há muito se transformou numa farsa, quando as instituições se vêem privadas do poder que lhes cabe face ao poder fáctico do chefe fardado mais em voga.
Por isso, de nada adianta o primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior (o tal que foi preso por militares há dias, chegando mesmo a ser por eles ameaçado de morte) vir dizer que a "situação está ultrapassada" ou que se deve trabalhar "para apaziguar os ânimos". Porque ele, neste estado de coisas, não pode garantir nada. Nem o Presidente, Malam Bacai Sanhá, que ontem foi a Luanda tentar nova desdramatização. A Guiné-Bissau só terá solução quando o poder militar for submetido hierarquicamente ao poder civil e isso só sucederá quando o exército deixar de ter "vida própria", como até aqui. Se as armas e os interesses do narcotráfico continuarem a ditar as leis, não haverá Estado de direito (que ali nunca houve, mas se deseja) nem socorro internacional que lhe valha.

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