7.4.10

Guiné-Bissau é refém dos seus militares

O poder político guineense “permanece refém de uma estrutura militar”, declarou à agência Lusa o ministro português dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, que tem estado diariamente em contacto com os principais órgãos de soberania do país.
“A Guiné-Bissau tem de fazer definitivamente esta opção: ou entra numa via de estabilização e de construção de um estado democrático ou se isola e se torna num caso flagrante de um estado falhado”, disse Amado, numa altura em que o Conselho de Segurança das Nações Unidas se encontrava em consultas sobre a necessidade de repensar toda a estratégia da segurança naquele país. E em que o Presidente Malam Bacai Sanhá encetava ontem conversações em Angola, um dos seus principais apoios.
“Não queremos aceitar o normal que não é normal” afirmou entretanto o chefe da diplomacia de Cabo Verde, José Brito, também ele convicto de que a conjuntura guineense actual “é muito complexa e pode lançar a Guiné-Bissau numa situação irreparável”, como considerou Amado.
Dia 1 de Abril militares dirigidos pelo vice-chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, general António Indjai, foram à procura do Presidente da Assembleia Nacional Popular, Raimundo Pereira, que não se encontrava na capital (nem aparentemente no país), sequestraram durante algumas horas o primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior e detiveram o Chefe do Estado-Maior, almirante Zamora Induta, bem como o chefe da secreta militar, coronel Samba Djaló.
Indjai actuou em coordenação com um antigo Chefe do Estado-Maior da Armada, contra-almirante José Américo Bubo Na Tchuto, que foi buscar à representação local da ONU, onde se encontrava refugiado desde que regressara do exílio na Gâmbia, no fim do ano passado; e que é tido como pessoa afecta ao narcotráfico sul-americano que passa pela África Ocidental.
Malam Bacai Sanhá tem estado sob pressão de uma facção dos militares e de partidos da oposição para afastar Carlos Gomes Júnior, mas também teve de tomar em conta os conselhos da comunidade internacional no sentido de não demitir um primeiro-ministro que é o resultado das legislativas de 2008.


Bubo Na Tchuto e António Indjai chegaram na semana passada a alegar que o chefe do Governo, e líder do PAIGC, seria conivente com alegados planos de Induta para promover execuções ou afastamentos compulsivos nas Forças Armadas, como já muitas vezes se têm verificado, desde que em 1974 Portugal reconheceu a independência da Guiné-Bissau.

Depois das primeiras horas da presente crise, Indjai foi forçado pelo Presidente da República a moderar-se e a pedir desculpas por ter, inclusive, ameaçado publicamente matar Carlos Gomes Júnior, se os partidários dele não deixassem de se manifestar nas ruas, a seu favor.



Primeiro-ministro em cheque

Quem pretende o afastamento do primeiro-ministro são, segundo o boletim confidencial “África Monitor Intelligence”, de Lisboa, o Partido da Renovação Social (PRS), de Kumba Yalá, o Partido Republicano para a Independência e Desenvolvimento (PRID), de Aristides Gomes (que era um dos homens de confiança do antigo Presidente Nino Vieira); e ainda uma ala do próprio PAIGC.

Tem-se falado da hipótese de os contestatários procurarem apresentar na Assembleia uma moção de censura, susceptível de ser aprovada se aos deputados do PRS e do PRID se juntassem pelo menos 20 dos 70 deputados do PAIGC, numa câmara legislativa de 100 lugares.

O actual Governo, constituído no fim de 2008, tem vindo a procurar reunir no exterior os meios financeiros necessários para a reforma das Forças Armadas que toda a gente considera essencial, dada a anomalia de as mesmas contarem com mais oficiais e sargentos do que propriamente com soldados.

O Japão, que se encontra este mês a presidir aos trabalhos do Conselho de Segurança, anunciou para Junho, em Nova Iorque, uma mesa redonda de dadores destinada a juntar o dinheiro para as reformas, de modo a que os militares guineenses não continuem a ser uma fonte permanente de desestabilização.

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