7.10.12

Guiné-Bissau: EUA admitem recurso a "drones"

À margem da Assembleia Geral das Nações Unidas, o Presidente Interino da Guiné-Bissau, Sarifo Nhamadjo, recebeu em audiência em Nova York emissários do departamento de estado norte-americano, num encontro centrado na problemática do narcotráfico na África Ocidental, em particular naquele pais. Com vários factores a concorrerem a partida para esta crescente apreensão da actual administração americana face ao alastramento do narcotráfico na região, Washington quis no fundo obter de Nhamadjo garantias seguras do engajamento das novas autoridades bissau-guineenses no combate a este flagelo. Os Estados Unidos manifestam-se disponíveis a apoiar as autoridades guineenses no desmantelamento das redes do narcotráfico que têm servido de fonte de financiamento dos grupos terroristas que operam na região. Para o efeito, Washington pretende de Bissau o aval para envolver as sofisticadas aeronaves não tripuladas, os conhecidos “Drones”, na vigilância permanente do espaço territorial sob jurisdição guineense. Esta disponibilidade dos Estados Unidos ficou patente no encontro que os emissários do assistente do secretario de estado americano para os assuntos africanos, Johnnie Carson, mantiveram em Nova York com o Presidente da República de transição guineense. Para Washington a insustentável e delicada realidade do narcotráfico na Guiné-Bissau impõe um urgente tratamento de choque. Utilizados pelo governo norte americano no combate a actividades terroristas no Afeganistão, no Iraque, na região do Corno de África e mais recentemente no norte de África, e no combate ao trafico da cocaína nas águas caribenhas, a Guiné-Bissau poderá em breve figurar na rota dessas aeronaves. Entre a velada pressão dos americanos e a ainda incógnita receptividade de Bissau, a ideia, com os militares golpistas a reservarem-se obviamente o direito à última palavra, Nhamadjo deixou os Estados Unidos esta quarta-feira, rumo a Bissau. “O transbordo de drogas através das porosas fronteiras do país está a aumentar desde o golpe militar de Abril último”- quem o afirma é Yuri Fedotov, o director da agência da ONU para o combate as Drogas e o Crime, Unodc. Para o Conselho de Segurança das Nações Unidas, a Guiné-Bissau está a reforçar a sua notoriedade como uma das principais placas giratórias da cocaína traficada para o mercado europeu. Perante tal cenário, Washington desdobra-se em denúncias de uma alegada promiscuidade entre sectores das estruturas militares do pais envolvidas no golpe militar e as redes do crime organizado. Já em 2010, os Estados Unidos haviam alertado as então autoridades guineenses para as consequências da nomeação de oficiais com suspeitas de cumplicidade as redes da cocaína. Um caso que a administração americana nunca perdoaria a Malam Bacai Sanhá e Carlos Gomes Júnior. Na sequencia deste acto de “rebeldia” duas altas patentes militares guineenses, o chefe de estado maior das força aérea e o ex-chefe de Estado Maior da Armada, respectivamente, Ibraima Camará e Bubo Na Tchuto, figuram desde então numa lista de “traficantes” do departamento de tesouro norte americano. Sob os dois oficiais impende a acusação de facilitadores de um carregamento de cocaína proveniente, em 2008, da Venezuela. Factos que ambos entretanto desmentem. Mas e com a conexão entre as redes do narcotráfico na África Ocidental e os grupos militantes islâmicos que operam no norte de África, com estes últimos a chamarem a si a tarefa de protecção das rotas da cocaína sul americanas pelo Sahel, e nos riscos da intensificação da operacionalidade de tais movimentos islâmicos em regiões ricas em urânio, petróleo e gás natural, que Washington está preocupada. Os próprios serviços secretos americanos não têm dúvidas do envolvimento de militantes vinculados ao grupo extremista Ansar al-Sharia, e de supostos membros da célula da al-Qaeda no norte da África, conhecida como al-Qaeda no Magrebe Islâmico, no ataque às instalações daquele consulado dos Estados Unidos, que vitimou o embaixador Chris Stevens e três outros Americanos que se encontravam na Líbia. A facilidade com que estes grupos extremistas se movimentam pelas “terras de ninguém” do Sahel, quais corredores para o tráfico e o crime organizado atestam, por outro lado, o quão real se tornou a ameaça do narco-terrorismo no continente. Para Washington a possibilidade de ocorrência de um cenário desta natureza na Guiné-Bissau, não está fora das suas previsões. Basta recordar que em Janeiro de 2008, uma operação conjunta envolvendo agentes dos serviços secretos franceses e da Polícia Judiciária guineense culminou na detenção, num hotel de Bissau, de Ould Sinda e Ould Sidi Charnou, operacionais da rede terrorista Al Qaida do Magreb, envolvidos um mês antes na Mauritânia, no sequestro e assassinato de quatro turistas franceses . Os dois teriam conseguido livrar-se da perseguição policial transfronteiriça e infiltrar-se pelas porosas fronteiras guineenses, disfarçados de homens de negócios, com o apoio de alegadas células locais daquele grupo extremista islâmico. E, pois confrontado com estes riscos que os Estados Unidos prontificam-se a um maior engajamento, com os parceiros oeste africanos no combate do flagelo através da “entrada a cena” dos aviões espiões não tripulados. Para já pouco ou nada se conhece dos moldes da proposta americana, nomeadamente se a semelhança da experiencia etíope, a mesma implicaria a instalação de bases de operacionalidade das aeronaves. Nhamadjo deixou os Estados Unidos esta quarta feira, rumo a Bissau levando ainda na bagagem um projecto de acordo de “Open Sky” (Céu Aberto) que permitiria a liberalização do acesso das aeronaves comerciais aos espaços aéreos dos respectivos países a par de um acordo bilateral que garanta a imunidade a soldados americanos diante do Tribunal Penal Internacional.. Trata-se de um expediente através do qual, Washington tem procurado arrebanhar apoios através de acordos bilaterais já rubricados com mais de 50 países. Diplomatas africanos nas Nações Unidas reconhecem que, ante a situação de isolamento internacional a que Bissau se encontra confinada, na sequência do golpe militar de 12 de Abril, com um simples “aceno”, Washington limitou-se a chamar a atenção das novas autoridades para as contrapartidas necessárias, em troca do reconhecimento. Nelson Herbert – Jornalista herbertlopes@yahoo.com Publicado no Novo Jornal de Angola

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