A Nigéria, com mais de 160 milhões de habitantes, é tudo menos homogénea. Da zona da savana à dos pântanos, das planícies de Sokoto ao Delta do Níger, é todo um vasto mundo em ebulição, com surtos de violência que de vez em quando chegam a causar centenas de mortos.
Jorge Heitor
Mais de 100 línguas e muito mais dialectos originaram perto de 380 modos de comunicação entre os cidadãos do mais populoso dos países africanos, em vias mesmo de se tornar um dos mais populosos do mundo, com provável assento permanente, a médio prazo, no Conselho de Segurança das Nações Unidas.
A Nigéria, dos haússas, dos fulas, dos yorubas, dos ibos e de tantos outros povos, com um crescimento de 6,6 por cento no seu Produto Nacional Bruto (PNB), tem estado muito conturbada desde que, em 2011, o sulista Goodluck Jonathan foi eleito Presidente, para suceder a um homem do Norte que falecera antes de acabar o seu mandato.
Jonathan terá de aplacar a ira de todos os muçulmanos das terras setentrionais; e de enfrentar a constante agitação social que se sente num país cujo PNB por habitante não ultrapassa os 1.570 dólares, sendo portanto inferior ao de Marrocos, da Líbia ou da África do Sul.
O conflito que tantas vezes tem sido ali associado ao facto de um pouco mais de metade dos nigerianos serem muçulmanos e perto de metade cristãos anda em certa medida relacionado com o facto de os primeiros desejarem alargar a ainda mais estados a aplicação da Sharia, "a lei islâmica ideal", que já vigora nos de Zamfara, Kano, Sokoto, Katsina, Bauchi, Borno, Jigawa, Kebbi e Yobe. E que está a ser parcialmente aplicada nos de Kaduna, Níger e Gombe.
O caso Boko Haram
Uma das grandes dores de cabeça da Nigéria actual é a seita Boko Haram, que vagamente se poderia traduzir por "a educação ocidental é um pecado". Trata-se pois de um grupo islamista, ou fundamentalista, que reivindicou a responsabilidade por um ataque às instalações das Nações Unidas na capital federal, Abuja; ataque esse em que morreram 18 pessoas, no dia 26 de Agosto último.
O Congresso dos Estados Unidos começou nas últimas semanas a prestar mais atenção ao terrorismo nesse autêntico gigante negro que é a Nigéria, assombrada pelo desejo que o Boko Haram tem de aplicar a Sharia a todo o território, fazendo assim a ponte da Al Qaeda no Maghreb Islâmico (AQMI) com as minorias muçulmanas dos Camarões e da República Centro-Africana.
Um proselitismo religioso poderia fazer com que o Islão se impusesse com mais força em todas as terras situadas entre o Estreito de Gibraltar e o Golfo da Guiné, colocando inclusive em risco os cristãos de países como a Costa do Marfim e o Ghana.
O congressista republicano Patrick Meehan, da Pensilvânia, afirmou em Washington que o grupo violento Boko Haram constitui uma ameaça para os interesses dos Estados Unidos. Tal como o bispo católico de Maiduguri, no estado nigeriano de Borno, já disse à Agência Fides que a seita se encontra ligada à AQMI, a rede terrorista fortemente implantada na Mauritânia, no Mali e no Níger, de onde os seus tentáculos poderão descer até às proximidades da linha do Equador.
Uma vez que o combate das forças federais nigerianas aos activistas da Boko Haram nem sempre se tem processada da melhor maneira possível, originando fortes ressentimentos, o que é mais de temer é que eles escalem os seus ataques e que eventualmente tentem as tropas a tomar uma vez mais o poder, como já várias vezes o fizeram no passado.
O nome oficial da organização que todos conhecemos por Boko Haram é Jama'atu Ahlis Sunna Lidda'awati wal-Jihad, palavras árabes que se poderão traduzir por "Pessoas empenhadas na Propagação dos Ensinamentos do Profeta e da Jihad", que é uma espécie de cruzada contra os que não seguem Maomé.
Portanto, o que se está a passar na Nigéria, com a vitimização de tantos cristãos, em conflitos entre comunidades de religião diferente, poderá ser o prelúdio de episódios ainda mais sangrentos, que do Planalto de Jos desçam à fronteira com os Camarões e daí, no futuro, às imediações da própria Guiné Equatorial.
O facto de nestes últimos meses as televisões raramente nos falarem da Nigéria não esconde o facto de se prever que em 2050 ela deverá ter quase 450 milhões de habitantes e no fim do século mais de 700 milhões. Daqui a 40 anos a África sub-sariana já deverá ter quase três vezes a população da Europa; e no seu conjunto toda a África é o continente que mais cresce, em termos populacionais.
Ao reflectir sobre tudo isto, não deixa de ser preocupante ver como é que os fundamentalistas, tanto os da Al Qaeda no Maghreb Islâmico como os do dito grupo Boko Haram, estão empenhados em ganhar terreno desde Marrocos até ao Delta do Níger e aos Camarões. É, pois, um assunto a acompanhar com o máximo das atenções, durante os próximos anos. (vai sair na revista Além-Mar de Janeiro)
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