14.12.11

Raúl Braga Pires escreve sobre Marrocos

Para além da retumbante vitória dos islamistas do PJD, com 107 deputados eleitos, mais 61 que na legislatura anterior, há outros factos que me parecem importantes realçar e analisar, agora que Abdelillah Benkirane estará prestes a apresentar o seu Executivo.

Em 2007, estavam registados nas listas eleitorais 15,5 milhões de potenciais votantes. Em 2011, estão registados 13,6 milhões, existindo cerca de 21 milhões de marroquinos em idade de votar, pelo que o número de registados deveria tendencialmente subir e não descer. A baixa deste valor absoluto, deve-se à tentativa das autoridades em amenizarem a crónica forte taxa de abstenção, a qual chegou a 63% em 2007, segundo os valores oficiais.

Nestas legislativas, o valor apresentado para a abstenção foi de 55%. Melhor, não se fala em abstenção, mas sim em taxa de participação, de 45%, ou seja, 6,1 milhões de marroquinos. Desta taxa de participação, foram contabilizados 1,6 milhões de votos nulos e em branco. Ou seja, 26% de votantes que se deram ao trabalho de se deslocarem às urnas para depositarem o seu voto de protesto, de rejeição de todos os partidos políticos, de todo um sistema, os quais representam 11,7% dos 13,6 milhões registados. Em rigor, apenas 33,3% de marroquinos decidiram o futuro dos próximos 5 anos, calculos sempre baseados nos número oficiais apresentados.

Quanto aos vencedores, há sobretudo a assinalar que representam/acompanham/marcam a mudança do paradigma que se vive pós-"Primavera Árabe", já que são o surgir de uma nova élite, a qual não foi formada no estrangeiro, não trabalhou em grandes multinacionais, nem tem graus de parentesco entre si. Neste sentido, foram legitimados pelo voto popular, o que também faz desta eleição talvez a mais limpa e transparente da História do Marrocos, dada também a presença de cerca de 4 mil observadores, de 12 instâncias marroquinas e 4 estrangeiras.

Nesse sentido, falhei completamente a previsão do texto anterior sobre as mesmas, quando alvitrei que se arranjaria uma maningância constitucional para evitar um Abdelillah Benkirane Chefe do Governo. Chegou mesmo a especular-se que o Artigo 47º da Constituição nada especifica sobre se deve ser o líder do partido mais votado o nomeado para chefiar o governo, abrindo assim a porta a outras possibilidades no seio do partido vencedor.

Mohamed VI foi escrupuloso e nomeou Benkirane Chefe do Governo, conferindo também desta forma a transparência já mencionada anteriormente. Uma semana depois reforçou o gabinete real com o anúncio da nomeação de mais 2 Conselheiros Reais, desta feita Yasser Zenagui, o ainda Ministro do Turismo e do Artesanato e, Fouad Ali El Himma, "O" amigo do Rei e seu confidente dos tempos do Colégio Real, ex-Ministro Delegado do Interior entre 2002/07, fundador do Mouvement Pour Tous Les Démocrates em 2007, o qual em Agosto de 2008 se torna no Parti Authenticité et Modernité(um dos grandes derrotados destas legislativas), tendo como objectivo principal contrabalançar a influência e popularidade dos islamistas do PJD.

Com esta passagem de El Himma de oficioso a oficial, terá um gosto especial seguir a gestão que o Palácio fará do Governo, bem como a gestão que o soberano fará das rivalidades entre os seus conselheiros, sobretudo entre El Himma e Mohammed Mounir Majidi, o gestor da fortuna real e também colega de carteira no Colégio Real.

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