16.8.14

Bissau: A continuidade de António Indjai

Artigo colocado em linha a 04-10-2011 (e que interessa reler)

Os importantes progressos socioeconómicos alcançados pela Guiné-Bissau na consolidação da estabilidade, justiça e segurança, permitindo assim o arranque da reforma no sector de defesa e segurança, alegadamente, parecem importunar certos elementos das forças armadas que planeavam destabilizar o país afastando o Primeiro-ministro das suas funções através de um golpe de Estado.
Esta eventual tentativa de golpe de Estado cujos rumores circulam no seio da classe castrense apontando o envolvimento de alguns militares de uma unidade dos arredores da capital considerada outrora como força de elite de alguns chefes, ameaça igualmente a integridade física do Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas (CEMGFA), Tenente-General António Injai e os seus próximos que os actores consideram como fortes opositores para o afastamento do Primeiro-ministro (PM), Carlos Gomes Júnior.
Os mesmos rumores acusam o Tenente-General de receber das mãos do PM importantes somas em dinheiro para mantê-lo no poder. O próprio CEMGFA falou da existência de manifestações de sentimentos e comportamentos tribais entre alguns “camaradas de uniforme” que alegam que o número um das Forças Armadas (FA) tinha virado as costas à etnia balanta enquanto membro da mesma.
Então face a gravidade dos rumores que se alastram progressivamente no seio dos militares, e não só, o CEMGFA e seu staff, acompanhado pelos Chefes dos Estados-Maiores de Ramos, realizaram, uma visita de trabalho de esclarecimentos e de sensibilização nas diferentes unidades de Bissau no dia 8 de Setembro, tendo passado pelos regimentos de Artilharia Terrestre, Para-Comando, Defesa Antiaérea e Força Aérea Nacional.
Esta visita foi considerada “necessária” para explicar aos camaradas a importância das FA, enquanto factor de estabilidade, se empenharem seriamente na conservação da unidade nacional, cultivando o espírito de patriotismo e o sentido de responsabilidade.
Nesta ordem, a caravana percorreu nos dias 8, 9 e12 de Setembro os aquartelamentos de Bissau onde o Tenente-General transmitiu as mensagens de esclarecimento e de sensibilização relativas aos rumores que indicam que o PM Carlos Gomes Júnior lhe tinha injectado importantes somas em dinheiro (suborno) para o manter no poder com o apoio dos seus colaboradores próximos. O CEMGFA citou os nomes que os rumores indicam, designadamente, Tenente-coronel Júlio Nhassé Comandante de Para-Comando; Coronel Antero João Correia, Chefe da Divisão de Informação Militar; Major Jaime, Adjunto do Comandante de Para-Comando; e, Coronel Tomas Djassi, Chefe de Divisão de Operações e Treino.
O Tenente-General que manifestou-se inocente das acusações expressas nos rumores relativos à sua pessoa. Perguntou as tropas : “há alguém capaz de confirmar que de facto recebi algum dinheiro das mãos do PM para em contrapartida o manter no poder? Se, de facto, o PM me tivesse dado dinheiro, eu construiria um edifício de 15 pisos. Esses rumores são falsos!”
No que diz respeito à destituição do poder do PR e do PM, Injai sublinhou que não tem competência de faze-lo como querem os pretendentes ao poder.
“A destituição das duas figuras públicas ou de qualquer outro membro do Governo pelo CEMGFA, é um golpe de Estado camaradas. Dar golpe de Estado é a única forma que um CEMGFA tem para tirar o PR e o PM das suas funções porque na Constituição da República, não existe lei ou artigo que confere ao CEMGFA competências para exonerar o PR ou PM e qualquer outro membro do Governo”, disse ele.
“Portanto se alguém quer que eu dê golpe de Estado na Guiné, garanto-vos que não vou fazê-lo e nem o farei. O PM chegou ao poder através de votos nas urnas, por isso quem tem a competência para lhe destituir são os eleitores e não o CEMGAFA, nem tão pouco as FA”, defendeu o Tenente-General.
Ciente da importância do respeito às leis, o Tenente-General apelou as tropas da Guiné-Bissau a abandonarem o recurso a violência para resolver os problemas nacionais ou pessoais e que pensem no futuro do povo, dos seus filhos que não conseguem sustentar nem os custos escolares e nem a formação por falta de meios. Também disse que muitos Combatentes da Liberdade da Pátria morrem, divido a falta de dinheiro para suportar os encargos de assistência médica e medicamentosa.
Por isso reafirmou que “com tiros de armas e este tipo de comportamentos, o nosso fio de conduta inclusive a imagem das FA serão postos em causa. É bom que os camaradas fiquem quietos nos quartéis e evitem as perturbações para que o Estado possa criar condições de atender as preocupações do exército.”
Neste óptica encorajou os jovens militares a redobrarem os esforços nos estudos da língua francesa para assim facilitarem os contactos com os países da sub-região durante as missões. Voltando ao assunto, o Tenente-General disse que os implicados na alegada tentativa de golpe de Estado serão todos transferidos para as unidades militares e Guarda Fronteira do interior. Ameaçou cancelar vencimentos de qualquer desobediente a ordem de transferência.
Hoje segundo revelou, a ideia principal do Chefe das FA é criar estabilidade, paz, e segurança para que o país possa avançar. Por isso, convida a todos a abraçarem o diálogo através da qual é possível a gente se entender e ultrapassar as divergências e mal entendidos.

Fomento de sentimentos tribalistas

Outra questão preocupante referida pelos rumores de que falou o Tenente-General, é o fomento de sentimentos e comportamentos tribalista que os alegados golpistas utilizam como arma para alcançar os objectivos. São fenómenos inabituais na Guiné e nas FA, em fase embrionária, mas que Injai entende dever combater sem tréguas no meio da classe castrense com vista a preservar a paz, a justiça e a unidade nacional que Amílcar Cabral criou e cimentou.
Para ilustrar as consequências do tribalismo, Injai citou os recentes exemplos do conflito interétnico de Ruanda durante o qual tabancas, famílias inteiras foram arrasadas. “Esta triste lição não pode nem deve acontecer na Guiné-Bissau, que é um pequeno país muito misturado em termos de casamentos e de laços sanguíneos. Portanto o tribalismo não tem lugar neste país”, disse.
“Estou à testa das FA para servir os guineenses e não para servir os balantas. Pois se fosse este o poder da etnia balanta, não estaria neste lugar. Ontem, a tribo dos guineenses era camarada, é isso que toda a gente conhecia. Ninguém sabia se existiam mandjacos, balantas, mandingas, fulas, entre outros. Aliás, ninguém se interessava saber a origem de um ou de outro. Hoje, a gente quer trazer de volta diferenças entre camaradas com base em tribos. Sou de facto um balanta puro sem qualquer mistura étnica; mas asseguro-vos que vou dirigir enquanto guineense e não enquanto balanta”, esclareceu, acrescentando que vai dirigir as FA “enquanto guineense como está a fazer cada um de vocês no seu posto de trabalho. Qualquer guineense que compactua com o tribalismo, é porque não conhece a história do Ruanda e nem ouviu falar dela. Amílcar Cabral nunca ensinou aos guineenses o tribalismo.”
No entretanto, para alertar os camaradas sobre a evolução progressiva deste sentimento, o CEMGFA relatou as palavras que uma pessoa lhe dirigiu no dia 5 de Setembro do corrente, quando foi assistir ao funeral de uma criança do Coronel Alberto Cabi, oficial de transmissões. “Nessa circunstância, uma pessoa chamou-me e disse-me “você é António Indjai? Quando chegou ao poder, nós pensávamos que iria descansar (salvar) os balantas mas afinal você vai virar-lhes as costas. Mas, a sua vez chegará.” Então respond
i-lhe dizendo, “camarada, se quer matar-me, mate mas eu não farei o que querem. Não sou balanta para defender a soberania dos balantas mas sim para defender a soberania nacional. E não vou matar alguém por vossa causa.” A missão das FA é garantir a soberania, estabilidade e a integridade territorial e não garantir a soberania e integridade de uma etnia”, referiu. 
Reforma

No que diz respeito a reforma em curso no sector da defesa e segurança, o CEMGFA disse que os rumores apontam que ela está direccionada contra os militares da etnia balanta porque são maioritários entre os efectivos e que apenas os militares desta etnia serão reformados.
“É absurdo pensar que uma pessoa actualizada madura, pode ter tais imaginações ao ponto de acreditar em ideias utópicas como estas. Somente homens sem maturidade confiam nestas palavras”, contestou.
O oficial general afirmou que o Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA) nunca solicitou, no quadro deste processo, aos comandantes das unidades a entrega de listas de candidatos a reforma contendo mais nomes de balantas do que outras etnias sublinhando que “no processo, são adoptados critérios de reforma que são idade, estado de saúde, voluntariedade e indisciplina.”
O Tenente-General repisou que a reforma deve ser bem organizada para evitar que haja depois da sua implementação combatentes nas ruas da capital a puxar carretas de mão para garantir a sua sobrevivência como sucedeu outrora. Esckareceu que os técnicos militares não serão reformados senão por motivo de doença ou incapacidade física.
Sobre os rumores de golpe de Estado, o Chefe Estado-Maior da Armada, Contra-Almirante José Américo Bubo Natchuto, garantiu que as pessoas podem ficar tranquilas porque a Marinha não tem outras intenções contraproducentes contra ninguém e nem tem o nome que se lhe atribui. “O passado fica no passado”, disse ele.
Sustentou que não criou na Marinha um gabinete onde recebe os políticos, para a seguir garantir que não recebe ninguém, e, apelar que “os políticos não venham cá na marinha”. No entanto ressalvou que o certo, é que tem familiares políticos e amigos políticos muito antes dos rumores.
Solicitou ao Tenente-General para que quando ouvir informações ou rumores que tocam o seu lado que lhe convoque para esclarecer o assunto.

IN “O DEFENSOR”
---------------------  Entretanto, já passaram presidentes e primeiros-ministros, mas António Indjai continua na chefia do Estado-Maior General das Forças Armadas da Guiné-Bissau. Até quando?

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