15.4.11

Procuremos compreender melhor o Norte de África

Uma ténue barreira civilizacional separa uns dos outros, desde há muito, os povos que vivem a norte e a sul do Mar Mediterrâneo. Do lado de cá os cristãos, desde a bacia do Guadalquivir até uma parte da ilha de Chipre. Do outro lado os muçulmanos, desde Tânger à Faixa de Gaza.
É uma espécie de escudo invisível, aquele que nos leva a encarar como longínquos os povos do Magreb, se bem que Tunes ou Tripoli fiquem mais perto da Península Ibérica do que o ficam Creta ou a foz do Danúbio.
Habituámo-nos, desde a passagem de Granada para os Reis Católicos, a que tudo o que se passava para baixo da Andaluzia ou das Baleares já não nos dizia respeito, a nós, os descendentes de íberos e de celtas. Gerou-se um fosso, difícil de ultrapassar.
Agora, porém, que a Tunísia, o Egipto e a Líbia tremeram, no modo como estavam a viver no início do século XXI, é bem altura de os povos latinos começarem a interessar-se muito mais pelo quotidiano de Marrocos, da Argélia e das demais terras que os árabes conquistaram no século VII, ao instalarem-se em Kairouan, ao sul de Cartago.
Os árabes e os berberes que eles submeteram são os seres humanos que ocupam todo o espaço compreendido entre o Sara Ocidental e a Síria, numa série de sistemas políticos que nada têm a ver com os da União Europeia, espécie de fortaleza essencialmente cristã que vai das ilhas dos Açores a toda a profusão de ilhas que a Grécia tem.
Depois de o Presidente egípcio Hosni Mubarak ter sido forçado a abandonar o Cairo, a imprensa internacional concentrou-se numa espécie de surto revolucionário que poderia abalar a Líbia, a Argélia, Marrocos e o Iémen, entre outras terras habitadas por muçulmanos, na sua maioria jovens, em busca de novas formas de vida.
Vivendo de ilusões, muitas vezes a olhar mais para a longínqua Coreia do Norte ou para o Irão dos ayatollahs, as chancelarias europeias não tinham sabido prever atempadamente o que é que se estava a gerar desde o Vale do Nilo às velhas Colunas de Hércules; ou seja, ao estreito de Gibraltar.
No entanto, durante o mês de Fevereiro ficou bem claro que chegaríamos ao Verão com um Norte de África substancialmente diferente daquele que havia aquando da viragem do século. Uma grande incógnita se estava a abrir para regiões que ainda há 70 anos eram alvo da cobiça de interesses espanhóis, franceses, italianos e britânicos. JH (parte de um artigo que saiu este mês na revista Além-Mar)

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