18.10.13

O perdão parcial da dívida alemã, em 1953

O Acordo de Londres de 1953 sobre a dívida alemã foi assinado em 27 de Fevereiro, depois de duras negociações com representantes de 26 países, com especial relevância para os EUA, Holanda, Reino Unido e Suíça, onde estava concentrada a parte essencial da dívida. A dívida total foi avaliada em 32 biliões de marcos, repartindo-se em partes iguais em dívida originada antes e após a 2ª guerra. Os EUA começaram por propor o perdão de toda a dívida contraída após a 2ª guerra. Mas, perante a recusa dos outros credores, chegou-se a um compromisso. Foi perdoada cerca de 50% da dívida e feito o re-escalonamento da dívida restante para um período de 30 anos. Para uma parte da dívida este período foi ainda mais alongado. Assim, parte do pagamento da dívida foi condicionada à reunificação. Só em Outubro de 1990, dois dias depois da reunificação, o Governo emitiu obrigações para pagar a dívida contraída nos anos 1920. A ideia de condicionalidade do pagamento (pagamento apenas do que se pode - e quando se pode) esteve sempre presente desde o início das negociações. O acordo visou, não o curto prazo, mas antes procurou assegurar o crescimento económico do devedor e a sua capacidade efectiva de pagamento. O acordo adoptou três princípios fundamentais: 1 - Perdão / redução substancial da dívida; 2 - Reescalonamento do prazo da dívida para um prazo longo; 3 - Condicionamento das prestações à capacidade de pagamento do devedor. O pagamento devido em cada ano não pode exceder a capacidade da economia. Em caso de dificuldades, foi prevista a possibilidade de suspensão e de renegociação dos pagamentos. O valor dos montes afectos ao serviço da dívida não poderia ser superior a 5% do valor das exportações. As taxas de juro foram moderadas, variando entre 0 e 5%. A grande preocupação foi gerar excedentes para possibilitar os pagamentos sem reduzir o consumo. Como ponto de partida, foi considerado inaceitável reduzir o consumo para pagar a dívida. O pagamento foi escalonado entre 1953 e 1983. Entre 1953 e 1958 foi concedida a situação de carência durante a qual só se pagaram juros. A estratégia alemã de negociação foi formulada e conduzida com todo o rigor e com a articulação de todos os agentes políticos. Mesmo perante as condições acima referidas, o Bundestag começou por recusar. O acordo foi, finalmente, assinado mas sob fortes votos de protesto e só depois de forte pressão dos E.U.A. O cumprimento do Acordo, por parte da Alemanha, foi possível graças a flexibilidade do seu articulado (pagamento condicionado pelo crescimento) e à política de desestatização/desnazificação levada a cabo pelos políticos regeneradores alemães, essencialmente Ludwig Erhard1, no Ministério da Economia, firmemente apoiado por Konrad Adenauer na Chancelaria. IV O Acordo de Londres de 1953 sobre a dívida alemã é um estudo de caso muito interessante que tem interessado os estudiosos das situações de insolvência soberana para nas quais o tema do pagamento condicionado é incontornável Ainda muito recentemente, o governador do Banco Central da Irlanda elaborou, publicamente, uma interessante reflexão sobre o pagamento condicionado do serviço da dívida soberana irlandesa2. Para a presente situação portuguesas o estudo do Acordo de Londres também não deixa de ter uma enorme importância. A ponderação da nossa situação leva-nos a sublinhar três exigências que a experiência alemã mostra serem incontornáveis: 1. A negociação da redução da dívida, o alongamento para um período adequado dos pagamentos e a redução dos juros para níveis moderados (próximos de 3,5%); 2. A entrada em acção de agentes políticos regeneradores, livres das responsabilidades pelas loucuras que provocaram o endividamento excessivo, com elevada capacidade negocial face aos credores; 3. A formulação e execução de uma política equivalente à desestatização/des nazificação da Alemanha que represente uma efectiva ruptura face ao persistente modelo estatizante que nos conduziu até aqui. Avelino de Jesus, Jornal de Negócios

Nenhum comentário: