No dia 25 de Abril de 1974 eu trabalhava, era jovem e respeitado, recebia um salário decente, que me dava para já ter conhecido Madrid, Barcelona, Maiorca, Ibiza, Roma, Assis, Florença, Bolonha, Veneza, Paris, Nice e o Mónaco.
Hoje, estou na reforma, a juventude já se foi, a pensão tem sido reduzida e já nem sequer me atrevo a viajar até Huelva ou Bragança.
No dia 25 de Abril de 1974 o meu salário dava-me para ir regularmente ao cinema e ao teatro, comprar livros e discos.
Hoje já não vou ao cinema nem ao teatro, de há muito que deixei de comprar discos e livros é só um ou outro, de longe em longe, normalmente em segunda mão.
São estas algumas das diferenças que pessoalmente mais sinto entre a vida de há 40 anos e a vida de hoje.
Por alturas de 1973/1974 a Televisão transmitia normalmente programas de Ópera, de Música, de Poesia e de Teatro, rúbricas de João de Freitas Branco, de Leonard Bernstein, de David Mourão-Ferreira, de Pedro Homem de Melo. Hoje dá-nos programas de João Baião, Manuel Luís Goucha, Júlia Pinheiro e Fátima Lopes.
Estas são outras das diferenças que noto entre o tempo em que tinha 26 anos e o tempo de hoje.
Nessa altura, eu saberia dizer sem dúvida quem tinham sido todos os reis de Portugal e quais eram quase todas as capitais do mundo.
Hoje, vejo em concursos televisivos estudantes universitários e licenciados de 27 anos que não sabem muito bem a diferença entre o tempo de D. Afonso VI e o de D. Manuel II, entre Budapeste e Bucareste, etc.
Estes são alguns dos motivos porque não estou particularmente radiante ao ouvir falar tanto do 25 de Abril e endeusar essa data.
Dizem-nos que nos trouxe coisas boas, como o fim dos presos políticos. Mas também nos trouxe o crescimento desmesurado de certas fortunas e um desemprego da ordem dos 16 por cento.
Dizem-nos que nos trouxe peças de teatro e filmes que se encontravam proibidos, mas muitos de nós não temos dinheiro para os ir ver.
No balanço do deve e do haver, creio que o que deveríamos pensar era na exigência de uma sociedade muito mais justa, com menos desemprego, com melhores pensões para parte substancial dos idosos; em vez de andarmos a celebrar uma data que ficou para trás, que pertence ao Passado, que já não é de forma alguma o nosso amargo Presente.
Os cravos murcharam. Já nada significam. Jorge Heitor, 25 de Abril de 2014
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Um comentário:
- Antes do 25 de abril, Madrid, Barcelona, Maiorca, Ibiza, Roma, Assis, Florença, Bolonha, Veneza, Paris, Nice e o Mónaco, eram apenas uma miragem para mais de 99% dos portugueses.
- Antes do 25 de abril, menos de 5% com idade de reforma tinham direito a ela.
- Antes do 25 de abril também tinha na TV, touradas, cowboys, serões para trabalhadores do género Goucha e outros que mencionou, festivais da canção…
- Antes do 25 de abril não existiam estatísticas sobre o desemprego, mas quem não tinha trabalho, era uma percentagem enorme – quem trabalhava no campo, só tinha emprego quando não chovia, sem falar das feiras de recrutamento de mão-de-obra.
O que existe atualmente, é os seguidores do passado, que nos estão retirando tudo o que ganhamos com o 25 de abril, para liquidar a dívida que eles próprios e os banqueiros fizeram, não encontrando melhor maneira de a saldar do que retirar ao vencimento dos funcionários públicos e as pensões dos reformados.
Quantos Banqueiros viram as suas contas penhoradas? Quantos políticos e senhores do capital foram punidos pela grande corrupção.
Tudo isto não é culpa do 25 de abril!!!
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