23.11.14

Sócrates: Editorial do PÚBLICO

Detenção provoca terramoto político A PGR confirmou ontem que José Sócrates foi detido no âmbito de um inquérito em que se investigam suspeitas de crimes de fraude fiscal, branqueamento de capitais e corrupção. Para além do ex-primeiro-ministro, na quinta-feira já tinham sido detidos um empresário, um advogado e um motorista, num inquérito que investiga “operações bancárias, movimentos e transferências de dinheiro sem justificação conhecida e legalmente admissível”. A detenção de um antigo primeiro-ministro para interrogatório é um facto inédito na história da democracia portuguesa. Salvaguardando o princípio da presunção de inocência (para Sócrates e para todos os que estão envolvidos em José Sócrates foi detido. É inédita em Portugal a detenção de um ex-primeiro-ministro. E agora? casos de justiça que ainda não transitaram em julgado), a verdade é que nos últimos tempos têm-se acumulado os casos de investigações, detenções e condenações de ex-titulares de cargos políticos e altos quadros do Estado. Os mais optimistas dirão que é a justiça a funcionar. Os mais cépticos ainda desconfiam. Mas a verdade é que hoje é inegável que a justiça está mais à vontade (em termos de meios e de enquadramento legal) para lidar com casos de criminalidade económica mais sofisticada. Mesmo quem possa olhar para a justiça com optimismo, também não se pode deixar de indignar e estranhar a “recepção” de que Sócrates foi alvo no aeroporto, onde era aguardado por câmaras de televisão. Esta aparente fuga de informação levanta suspeitas de uma desnecessária procura de protagonismo por parte da justiça. A notícia da detenção de Sócrates caiu que nem uma bomba no meio político, num fim-de- semana recheado de eventos partidários. Além da IX Convenção do Bloco, cerca de 47 mil militantes socialistas elegiam António Costa para o cargo de secretário-geral do PS. Com muitos microfones à procura de uma primeira reacção, a generalidade dos partidos políticos esteve à altura de um momento delicado em que não se devem antecipar julgamentos e condenações. No PS, onde alguns como Ferro Rodrigues ainda chegaram a ensaiar uma espécie de reabilitação política de José Sócrates, a notícia da detenção do ex-líder provocou, num primeiro momento, perplexidade. E num segundo momento, um enorme embaraço. Se até hoje no Largo do Rato havia uma grande dificuldade em lidar com a herança da governação de José Sócrates, agora o assunto passou a ser de extrema delicadeza dada a gravidade das suspeitas que recaem sobre o antigo primeiro-ministro. António Costa sabe que não será fácil blindar o partido e separar águas, numa altura em que falta menos de um ano para as legislativas. Mas esteve bem em apelar para que os eventuais “sentimentos de solidariedade e amizade pessoais” não se confundam com a acção política. À justiça o que é da justiça. Aos partidos exige-se que saibam lidar com as réplicas que este terramoto na justiça irá provocar no terreno político.

Nenhum comentário: